Pequenas agricultoras ameaçadas

É de amplo conhecimento que o desmatamento, o uso inadequado de pesticidas em atividades agrícolas e o aquecimento global têm feito vítimas entre os insetos, com destaque para as abelhas, cujas colônias têm diminuído significativamente.

Considerando-se que os insetos – e as abelhas de modo especial – são os principais agentes de polinização de 90% das plantas do planeta que produzem frutos, a constatação de que estão diminuindo é no mínimo preocupante, embora artigo da revista britânica The Economist afirme que essa redução não procede.

Abelhas da espécie Apis mellifera aumentam a produtividade da canola em até 70%

Estudo recente feito por pesquisadores da Faculdade de Biociências da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) vem novamente reiterar a importância da abelha em cultivos agrícolas. O trabalho mostra que as da espécie Apis mellifera aumentam a produtividade da canola (Brassica napus) em até 70%.

“Pesquisas científicas já realizadas com essa cultura constataram que ela é a polinizadora mais eficiente dessa espécie vegetal”, afirma a bióloga Annelise de Souza Rosa, responsável pelo estudo, sob orientação da bióloga Betina Blochtein.

Flor de canola
Lavoura de canola em flor (foto: Annelise de Souza Rosa).

A pesquisa de Rosa acompanhou desde o período da pré-floração até a colheita da canola em 13 hectares de uma área agrícola da Sociedade Educacional Três de Maio, no município de Três de Maio, no noroeste do Rio Grande do Sul, a 475 km de Porto Alegre. No local havia dois apiários, com 18 e 20 colônias, respectivamente.

Embora a Apis mellifera esteja diretamente relacionada com o aumento da produtividade da canola, a equipe de Rosa alerta para a necessidade de manejo adequado de colmeias nas imediações dos cultivos, visando à polinização dirigida.

“Manejos inadequados podem causar prejuízos para as abelhas e comprometer a produtividade da cultura”, diz a bióloga. Segundo ela, as abelhas devem ser introduzidas nas lavouras quando pelo menos 10% da floração estiver em evidência, para que haja disponibilidade de recursos alimentares ofertados pelas flores (néctar e pólen).

Abelha coleta pólen
Abelha coleta pólen. Entre os insetos, elas são os principais agentes de polinização de 90% das plantas do planeta que produzem frutos (foto: Arthur Chapman).

Entre nós por acidente

Conhecidas como abelhas africanizadas, as Apis mellifera existem no Brasil por causa do biólogo Warwick Kerr. Na década de 1950, por meio de um programa de melhoramento genético das abelhas africanas (Apis mellifera scutellata), Kerr pretendia contribuir cientificamente para a melhoria da apicultura nacional.

'Apis mellifera' em colmeia
Abelha ‘Apis mellifera’ trabalha em uma colmeia, onde podem viver até 60 mil indivíduos (foto: Thomas Bresson).

Embora muito produtivas, elas eram também bastante agressivas, muito mais que as dóceis abelhas europeias, empregadas na apicultura brasileira desde o século 19.

Durante os experimentos de Kerr, acidentalmente um apicultor visitante removeu a tela protetora que impedia a fuga das abelhas.

Algumas rainhas, acompanhadas por enxames de operárias, abandonaram suas colmeias, propiciando o surgimento de híbridos com características predominantes das abelhas africanas, hoje conhecidas como abelhas africanizadas.

Por causa da rusticidade e de sua maior capacidade de enxamear, essas abelhas se adaptaram e se expandiram rapidamente por quase todo o continente americano.

A abelha africanizada é vital para as lavouras de canola

A espécie é agora comprovadamente vital para as lavouras de canola, que estão em expansão no Rio Grande do Sul, estado responsável por 85% da safra brasileira da planta.

Terceira oleaginosa mais produzida no mundo, atrás apenas da palma e da soja, a canola foi desenvolvida por pesquisadores canadenses na primeira metade da década de 1970, a partir de melhoramento genético convencional da colza (Brassica napus L).

A palavra canola é um termo genérico internacional que significa azeite canadense de baixo teor ácido (Canadian Oil Low Acid). O óleo tem várias utilidades, inclusive como lubrificante na indústria de fundição. Mas destaca-se por seu amplo uso na indústria alimentícia.

Lavoura de canola
Lavoura de canola em área agrícola de Três de Maio, município no Rio Grande do Sul (foto: Annelise de Souza Rosa).

O óleo de canola é um produto saudável por conter grande quantidade de ômega-3 (ácido graxo que reduz triglicerídios), vitamina E (antioxidante), gorduras monoinsaturadas (diminuem o mau colesterol) e baixo teor (o menor de todos os óleos vegetais) de gordura saturada.

Por isso, é tão apreciado por pessoas interessadas em dietas saudáveis. Mas, com a paulatina diminuição das abelhas responsáveis pela polinização da planta, sua produtividade está comprometida.

Luan Galani
Especial para a CH On-line / PR