No início do ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) descriminalizou o aborto de fetos anencéfalos, que não têm parte ou a totalidade do cérebro ou da caixa craniana. A decisão motivou a Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) a lançar duas cartilhas – uma para médicos e outra para mulheres – sobre como evitar esse problema na gravidez.
A recomendação dos médicos, que segue parâmetros internacionais, é que toda mulher que planeje engravidar tome um suplemento de ácido fólico, também conhecido como vitamina B9, encontrado em farmácias e fornecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A dose deve ser de 400 microgramas diárias iniciada um mês antes da concepção e continuada durante os três primeiros meses da gestação.
A vitamina auxilia na replicação correta do DNA, evitando a ocorrência de erros na formação do tubo neural, estrutura que dá origem ao cérebro, à medula e à caixa craniana.
Além da anencefalia – que tem por consequência a morte do feto em todos os casos –, a suplementação pode evitar deformidades como a espinha bífida, em que a coluna vertebral não se fecha por completo e deixa a medula exposta, provocando, muitas vezes, a paralisia das pernas.
O médico obstetra Eduardo Fonseca, um dos autores das cartilhas e presidente da Comissão Nacional Especializada em Medicina Fetal, explica que não adianta começar a tomar ácido fólico depois da concepção. Isso porque o momento crucial de formação do tubo neural acontece na fase inicial da gestação, entre o 17º e o 30º dia após a fecundação.
O ácido fólico é encontrado naturalmente no milho, no feijão, em folhas escuras, no fígado, na gema do ovo e na laranja. Além disso, está presente na farinha de trigo que, por lei brasileira, é enriquecida com a vitamina. Cada 50 gramas de farinha contêm 150 microgramas de ácido fólico. “O ideal é planejar a gravidez”, reforça. “Geralmente, a mulher percebe que está grávida depois de um dia ou dois de menstruação atrasada. A essa altura, o feto já passou pela fase do fechamento do tubo neural.”
Mas Fonseca alerta que a quantidade presente nesses alimentos não é absorvida pelo organismo na dose necessária para gestantes e aponta que a melhor estratégia para quem quer engravidar é unir uma dieta rica na vitamina à suplementação.
“A fortificação da farinha ajuda quem engravida sem planejamento, diminuindo de 30% a 35% o risco de má formação do tubo neural do feto, mas a suplementação reduz de 72% a 85% o risco, por isso é mais seguro planejar a gravidez e usar os dois recursos”, diz.
Atenção para a dose
Como qualquer substância, o ácido fólico em excesso pode fazer mal. Existem estudos que ligam a superdosagem da vitamina ao desenvolvimento de câncer de mama na mãe e baixo peso pós-nascimento e asma nos filhos.
De acordo com a cartilha e com a Organização Mundial de Saúde (OMS), o limite máximo aceitável para a ingestão da vitamina é de mil microgramas por dia – quantidade que dificilmente é ultrapassada com a junção da suplementação de 400 microgramas com o ácido fólico proveniente da alimentação.
A exceção dessa regra vale para as gestações de alto risco. Quando a mãe já teve um filho com má formação do tubo neural ou tem doenças que requerem o uso de anticonvulsivos, como é o caso da epilepsia, a dose recomendada é 10 vezes maior, ou seja, de quatro miligramas por dia.
“Fora esses casos, não há motivo para tomar mais do que o recomendado”, reforça Fonseca. “É preciso ter cuidado, não é por que é vitamina que é bom e tem que tomar muito.”
Três milhões de exemplares da cartilha para médicos e pacientes já estão sendo distribuídos para os profissionais associados à Febrasgo. A instituição pretende ainda encaminhar cópias do material para serem replicadas pelas secretarias estaduais de saúde de todo país.
Sofia Moutinho
Ciência Hoje On-line