Ponte sobre o fosso

Uma oportunidade de abordar temas que não têm espaço em artigos científicos, mas que são importantes para a conexão entre ciência e sociedade. É assim que o biólogo Jean Remy Davée Guimarães, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, vê a sua coluna ‘Terra em transe’, publicada mensalmente na Ciência Hoje On-line.

A coluna é uma oportunidade de abordar temas importantes para a conexão entre ciência e sociedade

Guimarães apresentou uma palestra sobre o tema na última sexta-feira (22/6), na Casa da Ciência, no Rio de Janeiro, como parte das comemorações do aniversário de 30 anos do Instituto Ciência Hoje. Como fio condutor, o biólogo usou sua carreira científica, descrevendo os eventos e acasos que a direcionaram.

Segundo Guimarães, o que ele presenciou desde 1973, quando entrou para a graduação na UFRJ, foi a ausência de diálogo entre os cientistas e um grande fosso entre política e ciência, esta última ignorada ou mesmo atacada pelos tomadores de decisão.

“O impacto dos resultados das pesquisas científicas na realidade da população é praticamente zero, pelo menos na área ambiental, vide o novo Código Florestal e o estímulo ao uso de combustíveis fósseis”, observou o biólogo.

Lançamento livro Terra em transe
Jean Remy Guimarães autografa exemplar do livro ‘Terra em transe – crônicas de um planeta em risco’, que reúne textos publicados em sua coluna na ‘CH On-line’ e foi lançado após palestra na Casa da Ciência (RJ). (foto: Fred Furtado)

Diante desse cenário, Guimarães se disse chocado – positivamente – com a repercussão de uma de suas colunas, ‘Bagre não é salmão e escada não é solução’, na qual fala de uma pesquisa da Universidade Estadual de Maringá, no Paraná. O estudo mostrou que as escadas das barragens são uma armadilha, ao invés de benesse, para os peixes migratórios.

“Nada do que tinha feito até ali – 89 artigos científicos – teve impacto comparável àquele texto de mil e poucas palavras”

O texto levou um procurador público a reavaliar os projetos de construção de barragens que chegavam à sua mesa e pedir que as empresas apresentassem um programa ecológico para o trecho do rio localizado após a obra, em vez de implementarem as escadas.

“Nada do que tinha feito até ali – 89 artigos científicos – teve impacto comparável àquele texto de mil e poucas palavras; ele havia criado uma pequena ponte sobre o fosso entre ciência e política”, ressaltou Guimarães. “Percebi que a coluna era um veículo poderoso e me dediquei com mais afinco e alegria a escrevê-la.”

A palestra foi seguida do lançamento do livro Terra em transe – crônicas de um planeta em risco, que reúne os 42 textos publicados por Guimarães na CH On-line até março deste ano, incluindo aquele sobre bagres e barragens, citado acima.

Fred Furtado
Ciência Hoje/ RJ