A universidade precisa mostrar o que faz

Professora e pesquisadora da Unicamp, Sabine Righetti fala da importância de cientistas e instituições comunicarem mais e melhor seu trabalho à sociedade para enfrentar os ataques recentes, que vão muito além da redução de verbas.

Otimista declarada, Sabine Righetti, professora e pesquisadora do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor/Unicamp), consegue extrair algo positivo de toda a atual crise enfrentada pela ciência e pelas universidades públicas. “Os cientistas e as instituições começaram a pensar que precisam se comunicar mais e melhor. E o assunto universidade pública veio à tona. Houve e há um ataque, mas vamos sair fortalecidos”, prevê. O contra-ataque, para Sabine, jornalista de formação, é informação. É assim que ela luta nas redes sociais, conversando com quem está do outro lado. Uma de suas estratégias foi criar a hashtag #oquevinauniversidadepublica, que viralizou, mostrando à sociedade muito do que acontece nos campi Brasil afora. Outra empreitada sua, a Agência Bori, que entra em ação no segundo semestre, também será uma ponte entre a academia, a imprensa e, consequentemente, o resto da população. Coordenadora acadêmica do Ranking das Universidades do Brasil, da Folha de S. Paulo, ela lembra que, enquanto países como a China estão investindo no ensino superior, o Brasil faz o movimento contrário, o que se reflete nos resultados internacionais. “Não temos uma política de competição internacional, não atraímos cérebros ou recursos de fora. Ainda assim, temos muita ciência de ponta”.

CIÊNCIA HOJE: Como surgiu a ideia de usar o Twitter para destacar a realidade das universidades públicas, com a hashtag #oquevinauniversidadepublica?

SABINE RIGHETTI: Surgiu depois que comecei a ver pessoas falando mal da universidade pública nas redes sociais, postando fotos de gente pelada, que, claramente, são de bancos de imagem, as pessoas nem parecem brasileiras, em lugares que não se parecem com um campus. E escreviam: “olha aí, o que os estudantes fazem com o nosso dinheiro”. Aquilo me incomodou e escrevi um tweet dizendo “eu tenho 20 anos de universidade pública porque fiz graduação na Unesp e especialização, mestrado e doutorado na Unicamp, onde hoje sou professora, e nunca vi ninguém pelado, o que eu vi foi gente querendo aprender, vi laboratório sem insumo, aluno sem bolsa…” Isso foi à noite e, quando acordei de manhã, já havia milhares de retweets. Pelas respostas ao tweet, percebi que as pessoas estavam ansiosas para contar também suas experiências. Na tarde daquele dia, 1º de maio, criei a hashtag #oquevinauniversidadepublica, convocando as pessoas a falarem, porque, na minha cabeça, algum tomador de decisão, uma hora, vai ver isso e pode ser influenciado. Muita gente começou a contar histórias não necessariamente tão positivas porque envolvem laboratórios sem recursos, dificuldades, questões sérias da universidade, mas que não envolvem gente pelada. E viralizou. Até hoje a hashtag continua ativa, e dezenas de milhares de pessoas fizeram seus depoimentos.

Valquíria Daher
Jornalista / Instituto Ciência Hoje