Ao final da década de 1970, alguns estudos mostraram que vírus poderiam ser causadores de alguns tipos de câncer em animais. Essas evidências intrigaram pesquisadores no Japão e nos Estados Unidos, os quais estudavam a origem da leucemia de células T e dos linfomas cutâneos (ambos cânceres do sistema imunológico). Em 1977, na cidade japonesa de Kyoto, o pesquisador Takashi Uchiyama e seus colaboradores identificaram em 16 pacientes com leucemia de células T características comuns, como linfadenopatia (inflamação dos gânglios linfáticos), hepatoesplenomegalia (aumento do tamanho do fígado e do baço) e células que apresentavam um núcleo em forma de flor. Mas, o mais curioso para os pesquisadores era o fato de que 13 dos 16 pacientes estudados haviam nascido na mesma região do Japão.
O passo decisivo para o esclarecimento da origem dessa leucemia se deu a mais 11 mil quilômetros de distância pelo virologista norte-americano Robert Gallo e seu grupo de pesquisa em 1979. A partir de uma amostra de um paciente portador de linfoma cutâneo de células T, a equipe de Gallo isolou e identificou o primeiro retrovírus (vírus cujo material genético é codificado em uma molécula de RNA) humano com capacidade de causar câncer. O vírus foi denominado de Human cutaneous T-cell lymphoma virus ou vírus de linfoma cutâneo de células T humano. No entanto, a história mudaria esse nome. Além disso, foi confirmado que esse vírus também era o agente etiológico (causador) da leucemia de células T inicialmente estudada no Japão.
Em 1985, no Centro Hospitalar da Martinica, localizado em uma ilha das Antilhas no Caribe, identificou-se, em pacientes portadores de uma paraparesia espástica tropical (doença que promove a perda progressiva de movimento dos membros inferiores), a presença de anticorpos específicos para o vírus de linfoma cutâneo de células T humano. O grupo do virologista francês Guy de Thé (1930-2014) passou a chamá-lo de Human T-cell lymphotropic virus type 1 (HTLV-1), nome utilizado atualmente. Dessa forma, a descoberta que aconteceu 41 anos atrás se tornou marco inicial do estudo dos retrovírus causadores de cânceres em humanos.
Giovanna Perez Mello, Marcelle Gonçalves, Jennifer Muller e Juliana Echevarria Lima
Instituto de Microbiologia Paulo de Góes
Universidade Federal do Rio de Janeiro