Horror. Não consigo pensar em outra palavra para descrever minha sensação ao assistir à série Fazendas históricas, que a Amazon Brasil acaba de disponibilizar em sua plataforma de streaming. São 10 episódios – cada um sobre uma fazenda do Vale do Paraíba (região localizada entre os estados de São Paulo e Rio de Janeiro) –, aparentemente produzidos sem participação de historiadores profissionais. E eles fazem falta. Mais falta ainda fazem as vozes dos descendentes das pessoas escravizadas, muitos ainda moradores da região.
A série insiste em uma fórmula tão antiquada quanto equivocada: de fazenda em fazenda, os donos contam histórias pitorescas sobre “os áureos tempos do ouro negro, o café” (sic), no século 19. Mostram as casas-grandes, as louças usadas pelos barões, as relíquias que pertenceram à família imperial.
Na narrativa da série, a escravidão é quase um detalhe pitoresco. “Os escravos fujões valiam menos do que os outros”, conta o proprietário da fazenda União, com um meio sorriso no rosto. O problema da abolição, para ele, é ter provocado a decadência do café. Ao mostrar as peças de péssimo gosto do museu de cera, que retrata homens negros e mulheres negras sendo torturados, ele continua, mais ou menos com essas palavras: a escravidão é “infelizmente uma coisa que a gente não pode esconder debaixo do tapete”. A frase é repetida por outros proprietários. Exceção é o proprietário da fazenda Taquara, que protagoniza o último e melhor episódio da série, o único a mencionar o horror vivido pelos escravizados.
Keila Grinberg
Departamento de História,
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro