Mais tecnologia para o tratamento da Aids no SUS

O ano de 2019 estava no final e, como costuma fazer, o diretor do Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos) da Fiocruz, JORGE MENDONÇA, se dirigiu a toda a comunidade da instituição para prestar contas dos 12 meses anteriores e falar dos planos para o futuro. “Lembro-me até hoje: falei que 2020 seria o nosso ano mais fácil, pois havíamos equilibrado as contas, estávamos com um ótimo nível de produção, tínhamos conseguido fomentos para a área de pesquisa & desenvolvimento. Mas, em março, veio a pandemia. Tivemos que nos reinventar para garantir a segurança dos funcionários e não prejudicar a produção dos medicamentos”, conta o pesquisador, em sua segunda gestão à frente do Farmanguinhos. Dois anos depois, o instituto — maior produtor de antirretrovirais do país — começa 2022 com um grande passo: recebe a primeira leva de dolutegravir 50mg, um dos medicamentos mais modernos para pessoas que vivem com HIV, fruto de uma aliança estratégica e de prazo longo com a farmacêutica britânica GSK e a ViiV Healthcare, especializada no tratamento da doença. Nesta entrevista, Mendonça fala da parceria, que, em sua segunda fase, prevê transferência de tecnologia para que Farmanguinhos possa produzir no Brasil medicamentos de última geração.

CIÊNCIA HOJE: Pode falar da atuação de Farmanguinhos (Far) no tratamento de HIV e do que se trata o acordo com a GSK e a ViiV Healthcare?

JORGE MENDONÇA: Farmanguinhos, desde o final da década de 1990, vem atuando fortemente na produção de medicamentos para o tratamento do HIV. O instituto tem uma importância fundamental na sustentabilidade do programa nacional de HIV/Aids porque, por vários momentos, não só supriu o fornecimento de medicamentos, mas, também, conseguiu baixar muito o preço e servir como um balizador de tecnologia e de preços. Por volta de 2008, com a força do programa federal, Farmanguinhos obteve licença compulsória para produzir o efavirenz, na época o antirretroviral mais utilizado, o que trouxe uma redução de custos grande para o programa. Farmanguinhos tem, portanto, uma história importante de suporte ao programa, é o maior produtor de antirretrovirais do país. Hoje fornecemos ao Ministério da Saúde o que chamamos de 2 em 1, que é uma combinação de tenofovir com lamivudina, que, na ponta, é utilizada com o dolutegravir. Com essa parceria assinada ano passado, que chamamos de aliança estratégica, a partir de 2022, Far passa a fornecer os dois principais medicamentos para o tratamento do HIV, o dolutegravir, da GSK, e mais a combinação de tenofovir com lamivudina, que já fornecemos. A primeira remessa do dolutegravir chega agora em janeiro e será distribuída pelo SUS com a embalagem do Ministério da Saúde. Nos próximos dois anos, com a transferência de tecnologia, esperamos já estar produzindo o dolutegravir dentro de Farmanguinhos e, no futuro próximo, fabricar a combinação dele com lamivudina ou outras combinações que o Ministério da Saúde, por meio do programa de DST/Aids, aprove.

Por Valquíria Daher
Jornalista, Instituto Ciência Hoje