Mulheres do Carnaval: uma história quase invisível

A presença feminina foi apagada dos registros de fundação de escolas de samba do Rio de Janeiro. Na maioria das vezes, as mulheres ficam limitadas à exposição de sua aparência nas quadras e nos desfiles. Mas as passistas transformam a objetificação de seus corpos em ferramentas de empoderamento.

Houve um tempo em que a cantora e compositora carioca Dona Ivone Lara (1922-2018) era impedida de assinar suas composições no Império Serrano, sua escola de samba de coração. Nos anos 1960, ela, considerada a diva máxima do samba, era obrigada a deixar um primo assumir a autoria de suas músicas porque não fazia parte dos códigos sociais da época a participação feminina nos grupos de compositores. O lugar destinado às mulheres era a cozinha, onde eram as responsáveis pela comilança que abastecia as rodas de samba e os sambistas. A história de Dona Ivone simboliza as trajetórias de diversas mulheres no samba, que desempenhavam diferentes papéis, mas foram apagadas da memória coletiva e da historiografia oficial sobre essa manifestação cultural eminentemente popular.

A invisibilização começa bem antes, já no apagamento das atuações femininas relevantes para a criação e a consolidação do samba no Rio de Janeiro, como as das tias baianas nas famosas rodas de um território da cidade que ficou conhecido como ‘Pequena África do Rio de Janeiro’. Tias, por sua vez, pouco presentes nos livros brasileiros. A mais famosa foi tia Ciata (1854-1924), que apoiava os músicos e abria as portas de sua casa às rodas de samba. Ao longo dos anos, outras mulheres tiveram participação destacada na difusão do samba e de outros gêneros musicais da cultura popular, como a artista brasileira Nair de Teffé (1886-1981), esposa do então presidente do Brasil, Hermes da Fonseca (1855-1923), que, em 1914, se notabilizou por organizar um recital no Palácio de Governo com uma composição do gênero popular conhecido como ‘maxixe’ feita por sua amiga Chiquinha Gonzaga (1847-1935).

Bárbara Pereira

Jornalista e doutora em Memória Social pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro

Regina Abreu

Programa de Pós-Graduação em Memória Social
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro