Um futuro de calor, seca e fogo

O país tem acompanhado estarrecido, neste já conturbado 2020, os incêndios sem precedentes no Pantanal. Mas isso não surpreende Renata Libonati, coordenadora do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais (Lasa), do Instituto de Geociências da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A cientista, que estuda há 15 anos monitoramento de fogo e suas interações com o clima e a ação humana, explica que, com a contínua elevação da temperatura global e a falta de políticas concretas de prevenção, esses eventos se tornaram mais frequentes e intensos em diferentes pontos do planeta. E a tendência é que a situação piore ainda mais. Por isso mesmo, é tão relevante o trabalho da pesquisadora, também colaboradora do Instituto Dom Luiz (Universidade de Lisboa), que desenvolveu um sistema de monitoramento por satélite capaz de fornecer informações diárias, quase em tempo real, sobre as áreas queimadas e até rastrear a localização dos responsáveis pelo fogo, que já é usado pelo Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (PrevFogo) e o Ibama. Aos que vêm questionando as informações sobre queimadas fornecidas pelos satélites, ela faz uma analogia: “A partir do momento em que há satélites monitorando o globo todo, a previsão do tempo melhora de forma significativa. E assim como a meteorologia não vive hoje sem os satélites, o estudo do fogo também não é possível sem esse advento”.

Ciência Hoje: A frequência e magnitude dos incêndios florestais têm chamado atenção em vários lugares do mundo. Há, de fato, um aumento dessas ocorrências?


Os fogos, naturalmente, estão atrelados a esses eventos extremos, principalmente às secas e às ondas de calor

Renata Libonati: Temos observado, nos últimos anos, um aumento na frequência de eventos extremos, como secas, ondas de calor, furacões, enchentes. Tudo isso está ligado à elevação da temperatura média global em decorrência do aumento da emissão de gases do efeito estufa. Os fogos, naturalmente, estão atrelados a esses eventos extremos, principalmente às secas e às ondas de calor. Apesar de globalmente haver uma diminuição do total de área queimada, principalmente por conta da fragmentação da paisagem e de mudanças na cobertura do solo que criam barreiras físicas, nós observamos que a frequência das grandes destruições por causa do fogo tem aumentado em decorrência desse clima mais quente e seco, como vemos na Austrália, na Califórnia, em Portugal e aqui no Brasil, na Amazônia e no Pantanal… Os impactos desses eventos estão aumentando pela maior intensidade das ocorrências e o aumento da duração da época do fogo.

Valquíria Daher

Jornalista
Instituto Ciência Hoje