Reflexões sobre o fazer científico

Em que consiste o método científico? A que se pode chamar de ciência? Essas são perguntas que o livro Filosofia da ciência , de Alberto Oliva, procura responder. Correntes como o racionalismo, o empirismo e o positivismo lógico são apresentadas e discutidas nesse trabalho que oferece ao leitor iniciante um panorama histórico geral das reflexões sobre a prática científica, de Aristóteles a Thomas Kuhn.

A publicação, que faz parte da coleção Passo a passo , aborda essas reflexões sob o prisma de um mosaico temático, mais do que sob um viés cronológico. Aos poucos, o autor — coordenador do Centro de Epistemologia e História da Ciência da Universidade Federal do Rio de Janeiro — delimita o fazer da ciência sob a perspectiva de dois níveis fundamentais: lógico e empírico. As diferentes possibilidades de relacionamento entre essas ‘faces’ da ciência ilustram com clareza os debates epistemológicos.

Oliva dedica importante espaço para a discussão das questões contemporâneas da filosofia da ciência à luz dos pensadores clássicos. O diálogo entre as orientações descritiva, de Thomas Kuhn, e prescritiva, de Karl Popper, guia as críticas do autor ao racionalismo e ao pensamento empirista tradicional.

A perspectiva de Kuhn procura “mostrar como a ciência é de facto produzida” e estabelece relações com fatores psicossociais por meio da construção de paradigmas, fundamentais ao próprio desenvolvimento da ciência. Já a orientação de Popper “ambiciona recomendar procedimentos metodológicos supostamente superiores aos que vêm sendo empregados”.

Em comum, as duas correntes defendem que o homem não é capaz de observar imparcialmente o ‘estado puro’ das coisas. Há uma linguagem científica em permanente reformulação que, ao mesmo tempo, é a base fundamental de novas pesquisas e conceituações. E seriam intrínsecos a essa linguagem os constituintes sintático-semânticos, ou seja, lógicos e empíricos, naturalmente dependentes de pré-conceitos. Kuhn e Popper refutam, portanto, a tese empirista tradicional segundo a qual a ciência se constrói a partir da mera observação dos fatos ‘naturalmente’ dados.

Oliva apresenta ainda o objetivo último da filosofia da ciência de “formular um critério que permita distinguir as construções da ciência das especulações metafísicas e dos posicionamentos ideológicos”. Ao buscar um método consistente e universalizável, o autor defende uma epistemologia que questione, por exemplo, a cientificidade da sociologia.

Se “de Hobbes ao positivismo lógico, passando por Comte, muito se defendeu a tese da unidade do método científico”, as ciências psicossociais são exceção, segundo o autor. Elas teriam como problema “o debate metodológico endêmico” e ainda incorreriam na “possibilidade de instrumentalização política do (suposto) conhecimento produzido”, ou seja, seriam de fácil manipulação ideológica pois não estabelecem limites claros entre a metodologia e o domínio de objetos de estudo.

 

Um outro lançamento recente da mesma coleção, Filosofia medieval , oferece um panorama introdutório ao pensamento da Idade Média e procura desfazer mitos e preconceitos comumente associados a esse período. O autor, Alfredo Strock, professor de filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, mostra ser falsa a correspondência unívoca do período ao pensamento cristão e identifica ali as origens da metafísica enquanto disciplina científica.

 

Filosofia da ciência
Alberto Oliva
RJ, 2003, Jorge Zahar Editor
75 páginas – R$ 14,90
Filosofia medieval
Alfredo Storck
RJ, 2003, Jorge Zahar Editor
65 páginas – R$ 14,90

Julio Lobato
Ciência Hoje On-line
31/10/03