Uma tartaruga de barbas brancas é a imagem usada pelo engenheiro Cláudio Fernando Mahler para caracterizar a evolução da gestão de resíduos sólidos e a prática de reciclagem no Brasil. Isto é, o progresso tem sido pequeno e lento.
Reverter esse quadro – exposto na abertura do 3º Riskcycle Workshop – é parte dos objetivos do projeto homônimo, que pretende analisar o estado em que se encontra o processo de reciclagem no mundo e identificar contaminantes utilizados na cadeia produtiva. Esses produtos, sejam eles aditivos químicos ou materiais recicláveis, podem oferecer riscos ao ambiente e à saúde humana.
Iniciado em setembro de 2009 e coordenado pelo engenheiro alemão Bernd Bilitewski, da Universidade Técnica de Dresden, o projeto ainda está em suas primeiras etapas, que envolvem a discriminação das substâncias químicas presentes no processo de geração de resíduos sólidos – produtos remanescentes de atividades urbanas, rurais, industriais e de serviços de saúde.
Após a identificação dos contaminantes, a ideia é criar um padrão de gerenciamento do ciclo de vida dos produtos, de modo que possíveis riscos à saúde e ao meio ambiente sejam minimizados.
O ciclo de vida de um produto consiste em uma série de etapas, indo desde sua concepção, obtenção de matérias-primas e insumos até seu consumo e destinação final, passando pelo processo produtivo.
Pretende-se ainda estipular concentrações limites para o uso dessas substâncias e, por fim, retirá-las da cadeia produtiva.
Menos poluição e desperdício
O cromo, metal pesado utilizado na indústria do couro, e biocidas, presentes na indústria do papel, são exemplos de contaminantes. Na indústria têxtil e de eletrônicos, os riscos provenientes do uso de retardantes de chama bromados – substâncias utilizadas para prolongar o tempo inicial da combustão – já são bem conhecidos: acumulam-se no organismo, provocando alterações nos sistemas nervoso e hormonal.
No entanto, o risco potencial de muitos compostos usados na indústria ainda é desconhecido. “Na produção de papel, são utilizados 200 tipos de produtos químicos que ainda não estão listados e podem ser contaminantes”, afirmou Bilitewski durante a apresentação do projeto no evento.
A iniciativa enfocará esses quatro setores e também avaliará contaminantes na indústria de plásticos e de lubrificantes.
O Riskcycle está formando uma rede global para discutir o assunto, com participantes dos Estados Unidos, União Europeia, Ásia e Brasil. O primeiro workshop organizado no âmbito do projeto foi realizado no Vietnã; o segundo, na China.
O terceiro aconteceu nos dias 3 e 4 de maio, na Casa da Ciência, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O próximo será na Índia.
No Brasil, a regulamentação da Política Nacional de Resíduos Sólidos em dezembro do ano passado trouxe novos ares ao problema do lixo e à gestão desses resíduos. A lei apresenta duas novidades consideradas positivas: a instituição da logística reversa e a incorporação dos catadores de lixo como importantes atores sociais.
O ciclo de vida dos produtos, muitas vezes, é visto de forma linear, ou seja, algo é primeiro produzido, depois consumido e então descartado. A lógica reversa atribui outra ordem ao fluxo dos resíduos, em que o descarte não é definitivo.
Por meio de ações que facilitem a coleta e a restituição dos resíduos aos seus geradores, o produto é tratado e reaproveitado, mantendo-se na cadeia produtiva. Assim, reduz-se a poluição e o desperdício.
Gabriela Reznik
Ciência Hoje On-line