Rumo à terapia do futuro

 

Rumo à terapia do futuro O anúncio da clonagem de embriões humanos para extração de células-tronco, feito por cientistas coreanos em 12 de fevereiro em artigo da revista Science , traz esperança para a criação de terapias inovadoras, como a reconstituição da medula de indivíduos paralíticos ou a recuperação do tecido muscular cardíaco em pacientes que sofreram infarto. Essas seriam apenas algumas das aplicações da clonagem terapêutica, técnica que promete revolucionar a medicina.

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Estágio embrionário no qual surgem as células-tronco(blastocisto)

A equipe coordenada pelo médico veterinário Woo Suk Hwang, da Universidade Nacional de Seul (Coréia), criou pela primeira vez células-tronco embrionárias a partir de um embrião humano clonado , que chegou até o estágio de blastocisto com cerca de 100 células. “Esse foi um grande passo na direção da clonagem terapêutica, que não reproduz um indivíduo completo, mas apenas aqueles tecidos que precisam de reposição”, avalia a geneticista Lygia Pereira, do Centro de Estudos do Genoma Humano do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP).

 

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Células-tronco embrionárias do clone obtido por cientistas coreanos (foto: W.S.Hwang / Universidade Nacional de Seul)

As células-tronco embrionárias são do tipo pluripotente, ou seja, são capazes de se transformar em qualquer outro tipo de célula do organismo. Se o processo de diferenciação dessas células fosse direcionado, os mais diferentes tipos celulares poderiam ser cultivados controladamente para dar origem a tecidos e órgãos in vitro , o que tornaria viável a chamada engenharia de tecidos. Células-tronco de embriões descartados em clínicas de fertilização poderiam ser usadas nesse processo, desde que fossem compatíveis com o paciente. A clonagem de tais células eliminaria esse risco de rejeição.

 

Porém, a clonagem terapêutica e a engenharia de tecidos levantam uma série de questões éticas. Como garantir que a clonagem de embriões tenha apenas fins terapêuticos e não reprodutivos? Ao descartar tais embriões não estaríamos acabando com uma vida?

Alguns tecidos de um organismo adulto, como a pele, as paredes do intestino e o sangue, são capazes de se regenerar constantemente graças à presença de células-tronco. O uso de tais células-tronco adultas na engenharia de tecidos descartaria tanto o dilema ético quanto o risco de rejeição, já que células-tronco do próprio paciente poderiam ser adotadas para regenerar seus tecidos. “No entanto, ainda não se comprovou que as células-tronco adultas são pluripotentes como as embrionárias”, ressalta Lygia.

A geneticista trabalha há seis anos com células-tronco embrionárias de camundongos em seu laboratório. Sua equipe já conseguiu provar que elas são pluripotentes, ao produzir a partir delas células do músculo cardíaco, neurônios e células produtoras de insulina. Lygia e seus colegas estão apenas esperando a votação da Lei de Biossegurança, já aprovada pela Câmara dos Deputados, para começar os estudos com células-tronco embrionárias humanas.

O projeto de lei atual proíbe esse tipo de experiência, mas já existem propostas para acabar com a proibição. “Essa seria uma grande vantagem para a pesquisa científica no Brasil”, disse Lygia. “Mas deve haver regras para garantir que a clonagem tenha apenas fins terapêuticos e não reprodutivos.”

Liza Albuquerque
Ciência Hoje On-line
19/02/04