Sabedoria popular no laboratório

O cogumelo Langermannia wahlbergii , conhecido como bufo, é usado como curativo para feridas nas áreas rurais de Minas Gerais.

Moradores de regiões rurais de Minas Gerais têm o hábito de curar feridas com a ajuda de um cogumelo encontrado na terra, conhecido popularmente como bufo ( Langermannia wahlbergii ). Com o intuito de confirmar o poder cicatrizante dessa espécie, a médica Doutora Sônia Maria Neumann Cupolilo, pesquisadora da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), investigou seu efeito em testes com ratos. Os resultados preliminares indicam que a sabedoria popular pode estar certa, mas novos testes serão feitos para que o cogumelo possa dar origem a um medicamento.

A primeira etapa da pesquisa foi realizada em convênio com o Laboratório de Imunomodulação do Instituto Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro, e usou ratos brancos de laboratório. Os animais sofreram uma incisão cirúrgica no dorso e tiveram um pedaço de pele retirado. Em seguida, foram separados em três grupos. O primeiro teve a ferida tratada com assepsia e pontos, no método aplicado comumente na medicina. O outro grupo não recebeu qualquer tratamento, para que a ferida cicatrizasse espontaneamente. O último grupo recebeu um curativo feito de um fragmento do cogumelo, da mesma forma como ele é usado popularmente. Os ratos foram observados por 20 dias.

Aqueles que tiveram seus ferimentos tratados da forma tradicional foram os que obtiveram melhor resultado de cicatrização. Mas o grupo que recebeu os cuidados do cogumelo obteve melhor resultado de cicatrização do que o segundo, o que indica que os curativos de bufo são capazes de parar o sangramento e acelerar a cicatrização.

A pesquisadora alerta que isto está longe de significar que vem por aí uma pomadinha de cogumelo capaz de curar machucados. “Esta primeira etapa da pesquisa foi experimental, para avaliar se o bufo possui efeito cicatrizante”, ressalta Cupolilo. “O cogumelo foi testado in natura , não preparado quimicamente. No uso normal há riscos de infecção, inclusive por tétano. É preciso estudar os componentes químicos do bufo e analisar quais podem ser tóxicos ou terapêuticos ao ser humano”.

Princípio ativo
Para isto, uma segunda etapa de pesquisa já está planejada, com o intuito de identificar no extrato do cogumelo seu princípio ativo, ou seja, as substâncias com efeito cicatrizante que poderiam dar origem a um medicamento. É preciso comprovar se as feridas poderiam ser contaminadas pelo uso do bufo e se ele age sobre algum outro processo infeccional da pele. Serão feitos ainda testes para identificar em quais fórmulas o princípio ativo poderia ser encontrado no mercado: emplastos, soluções, ungüentos, pomadas ou via oral. A pesquisadora planeja realizar testes in vitro , com cultura de células, e in vivo , com animais que possam apresentar sintomas de infecções e inflamações.

Cupolilo aguarda agora recursos para custear as despesas com os ensaios. “Para dar continuidade ao projeto é necessário realizar testes em uma quantidade maior de indivíduos, o que envolve tecnologia, equipamentos e pessoal especializado”, conta. “Já temos convênios com laboratórios na UFJF e Fiocruz”, revela. A expectativa, segundo a bióloga, é que os testes tenham início dentro de mais um ou dois anos.

Juliana Tinoco
Ciência Hoje On-line
08/08/2006