Será que ela veio para ficar?

O alerta de nível máximo para pandemias feito pela Organização Mundial de Saúde confirma: a gripe A, antes conhecida como gripe suína, já acomete o planeta inteiro. Por ser um problema recente, há poucas pesquisas científicas sobre essa linhagem do vírus. Mas dois estudos publicados esta semana na Science alertam: além de ser mais severo que a gripe sazonal, o tipo A da doença pode se tornar tão comum quanto ela.

Micrografia colorizada do vírus H1N1 2009, causador da gripe A, que, segundo estudos recentes, é mais severo que o responsável pela gripe comum e pode se disseminar tanto quanto ele (imagem: CDC / Influenza Laboratory).

Para chegar a essas conclusões, os estudos – um realizado na Holanda e outro nos Estados Unidos – injetaram vírus da gripe A e da gripe sazonal (comum) em furões (Mustela putorius furo), por ser uma espécie que responde aos efeitos de gripes de forma similar aos seres humanos. Em seguida, compararam o quadro clínico dessas duas doenças e observaram aspectos como a severidade e a transmissibilidade do vírus.

A equipe holandesa introduziu os vírus da gripe comum e da gripe A em dois grupos de seis furões, que foram acompanhados clinicamente. Enquanto o grupo infectado com a gripe comum começou a se recuperar cerca de quatro dias após ser contaminado, os furões com a gripe A levaram seis dias para dar sinais de melhoras.

Severidade e contágio
“Nossos resultados mostraram que a gripe A veio para ficar”, alerta um dos autores do estudo holandês, o virologista Ron Fouchier, do Centro Médico Erasmus (Holanda), em entrevista à CH On-line. Segundo Fouchier, a nova gripe é mais severa e ainda apresenta um nível de contágio tão alto quanto o da gripe comum. “A gripe A atinge com muito mais força as vias respiratórias, especialmente os pulmões”, explica o virologista. O intestino dos furões também foi afetado pelo vírus da nova gripe.

Já o grupo norte-americano analisou vírus da gripe A de três locais diferentes: Califórnia, Texas e México. Em seguida, esses vírus foram introduzidos em três furões por suas vias respiratórias. Os animais foram acompanhados por 14 dias.

Em comparação com furões infectados com gripe sazonal, os animais contaminados com a gripe A sofreram uma perda de peso significativa. Assim como o estudo holandês, o norte-americano também percebeu que o vírus da gripe A era mais severo, pois atingiu com mais força os pulmões e também o intestino dos animais.

Apesar desses resultados comuns, os dois estudos chegaram a conclusões diferentes sobre o contágio da doença. “Esse novo vírus mostrou transmissão menos eficiente por perdigotos respiratórios do que o tipo sazonal da gripe”, explica à CH On-line o microbiólogo e coautor do artigo norte-americano Terrence Tumpey, do Centro para Controle e Prevenção de Doenças (EUA), contradizendo os resultados da equipe holandesa. Embora o estudo tenha considerado a gripe A menos contagiosa que a sazonal, Tumpey concorda que o vírus pode se tornar tão disseminado quanto o da gripe comum.

O motivo dessas divergências entre os estudos não é claro. “Elas podem ter a ver com as diferenças climáticas entre Estados Unidos e Holanda”, especula Fouchier. Já Tumpey tem outra ideia: “Os furões usados como modelo parecem ser levemente diferentes, e também é possível que haja uma pequena variação entre os vírus analisados.”

Comportamento imprevisível
Se esses estudos da Science confirmam a severidade da gripe A e apontam a possibilidade de ampla disseminação do vírus, devemos nos preocupar ainda mais? “Uma coisa que sabemos com certeza a respeito de gripes é que elas são imprevisíveis”, afirma Tumpey. “A incerteza de como o vírus da gripe A vai se adaptar entre humanos torna imperativo que se monitore de perto a evolução dessa pandemia.”

Para Fouchier, o fato de os estudos oferecerem mais dados científicos sobre a gripe A de 2009 vai ajudar os governos e organizações a lidar com decisões relativas à prevenção e à contenção da doença. “É difícil prevenir a transmissão, uma vez que o vírus é passado pelo ar”, diz. E completa: “Por isso, as ações devem ser focadas na produção de vacinas e antivirais.” 

Isabela Fraga
Ciência Hoje On-line
02/07/2009