Tatuagem que previne

No lugar da injeção, uma tatuagem capaz prevenir doenças como a Aids. Assim funciona a vacina desenvolvida por uma equipe do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês), que buscou um método capaz de estimular o sistema imunológico de modo eficaz e indolor.

Para construir a vacina, a equipe usou um conjunto de microagulhas cobertas por 20 camadas duplas de polímeros ligados a moléculas do DNA de uma proteína do HIV. Depois de 15 minutos em contato com a pele, as microagulhas são retiradas e o conjunto de polímeros penetra no tecido.

“As microagulhas rompem camadas muito superficiais da pele e não atingem terminações nervosas, evitando a dor”

De acordo com Peter DeMuth, coautor do estudo publicado na revista Nature Materials e bioquímico do MIT, a dimensão microscópica das agulhas usadas na vacina impede que a aplicação cause dor. “As microagulhas rompem camadas muito superficiais da pele e não atingem terminações nervosas, evitando a dor”, diz DeMuth.

Assim que são expostos à água presente nas primeiras camadas da pele, os polímeros começam a se degradar. “Quando as microagulhas são inseridas, o polímero se dissolve lentamente e promove uma liberação constante das moléculas de DNA”, explica o pesquisador.

Além do DNA viral, os polímeros são associados a substâncias que facilitam a entrada desse material genético nas células humanas. Com o DNA do vírus dentro delas, as células de defesa da pele podem produzir a proteína do HIV e apresentar ao restante do sistema imunológico, ativando mecanismos de defesa contra o vírus. O estudo também aponta que, além de serem usados na vacinação, os polímeros podem ser desenhados para aplicação de medicamentos.

Microagulhas
As microagulhas são cobertas por polímeros que liberam o DNA de uma proteína do HIV. Ao entrar na célula de defesa da pele, o material genético induz a produção da proteína viral, estimulando o sistema imunológico a produzir anticorpos contra o vírus. (foto: Peter DeMuth/ Wellcome Images)

A analogia com a tatuagem não é à toa. Apesar de não marcar a pele, a vacina gera uma liberação do material genético viral muito mais duradoura do que a promovida pela injeção. “Os polímeros liberam DNA por semanas e, quando o sistema imune é exposto ao material genético do vírus por tanto tempo, a resposta de defesa é muito mais intensa do que a injeção única usada tradicionalmente”, explica DeMuth.

O pesquisador adiciona que a pele é a região ideal para a aplicação dos polímeros por ter um sistema de defesa que responde melhor a vacinas do que o músculo. “Tradicionalmente, as vacinas são aplicadas no músculo, mas esse tecido não é tão exposto a infecções como a pele e, por conta disso, suas células de defesa são menos ativas”, explica.

As vacinas de DNA são antigas promessas para o tratamento de doenças virais e até cânceres. No entanto, estudos anteriores mostraram que a simples injeção do DNA do HIV não estimula o sistema imunológico humano de maneira eficaz. “O método mais eficaz usa pulsos elétricos para facilitar a entrada do DNA nas células de defesa, mas é muito dolorido”, explica DeMuth.

Testes em animais

Para avaliar a eficácia da nova vacina em comparação ao método tradicional, os pesquisadores aplicaram as microagulhas na orelha de camundongos. Quando comparados com animais que receberam o DNA do HIV via injeção intradérmica, os camundongos que receberam a vacina do MIT ficaram dez vezes mais protegidos contra o vírus.

O mesmo teste foi feito em macacos, mas, no lugar do DNA do HIV, a vacina continha um material genético que codifica a luciferase, uma proteína comum em insetos e organismos marinhos. Em comparação ao mesmo material inserido através de injeção intradérmica, as células do macaco produziram 140 vezes mais luciferase, mostrando que a nova metodologia pode ser muito mais eficaz que os métodos tradicionais. 

Os resultados sugerem que a nova metodologia pode ser muito mais eficaz que os métodos tradicionais

DeMuth conta que, além de mais eficiente, a vacina de polímeros é mais barata que a tradicional. Isso porque a estabilidade do DNA nesse material permite que ele seja mantido em temperatura ambiente sem perder sua eficácia. “A maior vantagem disto é facilitar e diminuir os custos do transporte das vacinas até países subdesenvolvidos”, completa.

A equipe pretende agora avaliar se a vacina é capaz de imunizar os macacos contra a Aids.

Mariana Rocha
Ciência Hoje On-line