Cenários de destruição, como os causados pelas chuvas na região serrana do Rio de Janeiro no início do ano, devem se tornar cada vez mais frequentes. Um estudo do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em parceria com o Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês) mostra que, em 2070, as tempestades serão três vezes mais comuns que hoje no litoral sudeste do Brasil, em decorrência das mudanças climáticas globais.
O estudo, divulgado nessa segunda-feira (8/8) em entrevista coletiva durante a 16ª Conferência Internacional de Eletricidade Atmosférica (ICAE), reuniu dados sobre a ocorrência mensal de tempestades nas cidades do Rio de Janeiro, São Paulo e Campinas nos últimos 60 anos.
A análise dessas informações mostrou que a conjunção do fenômeno La Niña, caracterizado pelo resfriamento das águas do oceano Pacífico, com o aumento da temperatura do Atlântico, causado pelo efeito estufa, é o que provoca as fortes tempestades no Brasil.
“Apesar de ocorrerem dez vezes mais tempestades no continente do que no oceano, está claro para nós que é a temperatura do oceano que regula a ocorrência de tempestades no Brasil”, diz o coordenador do estudo, o engenheiro eletrônico Osmar Pinto Junior, do Grupo de Eletricidade Atmosférica (Elat) do Inpe.
Segundo o pesquisador, embora a ocorrência e intensidade do fenômeno La Niña se mantenham estáveis, as médias de temperatura das águas do oceano Atlântico estão cada vez mais altas e tendem a continuar a subir, o que intensificará a força e a frequência das tempestades em todo o sudeste e, provavelmente, também no nordeste do país.
No período analisado, o Atlântico ficou 0,6ºC mais quente, enquanto a temperatura do planeta aumentou 0,8ºC. “Estamos falando de uma realidade e não de uma projeção ou modelo”, alerta Pinto Junior. “A probabilidade que este cenário se concretize é de 99%, uma taxa de confiabilidade que não pode ser ignorada.”
O pesquisador ressalta ainda que o cenário previsto no estudo pode ser antecipado se aumentarem as emissões de carbono, que provocam o efeito estufa.
“Esse aumento de temperatura do Atlântico está totalmente ligado ao aquecimento global e só conseguiremos reverter essa situação com a parada de emissões”, diz Pinto Junior. “Mas, como, a curto prazo, essa é uma meta impossível, o que nos resta é minimizar os efeitos através de planejamento e antecipação. Temos 60 anos para nos prepararmos.”
Onde há raio, há tempestade
Até 2012, a equipe de Pinto Junior deve concluir o estudo para todas as regiões do país. Mas independentemente do resultado obtido, o Inpe já começa a instalar, em parceria com Furnas, a Rede Brasileira de Detecção de Descargas Atmosféricas (BrasilDAT), que deverá prever a ocorrência de tempestades severas em todo o país.
O novo sistema, que irá substituir a atual Rede Integrada Nacional de Detecção de Descargas Atmosféricas (Rindat), além de ter uma maior área de abrangência, vai detectar não só as descargas elétricas que chegam ao solo (raios), mas também as que permanecem nas nuvens.
Pinto Junior explica que esse tipo de descarga elétrica que fica retido nas nuvens é um dos principais indicadores da intensidade de uma tempestade. “Uma tempestade pode ser muito forte e quase não ter raios, como aconteceu em Teresópolis no começo do ano, mas, se há muita descarga nas nuvens, é grande o potencial de desastre da tempestade, com agravamento como granizos e tornados.”
A rede, que será a segunda maior do mundo – atrás apenas da dos Estados Unidos – vai contar com 75 sensores sensíveis à radiação eletromagnética espalhados pelo país. Na ocorrência de descargas elétricas, esses aparelhos alertarão uma central, que poderá calcular a intensidade da tempestade a se formar e tomar as devidas providências.
Por enquanto, somente a região Sudeste está totalmente coberta pelo sistema, que deve estar implantado em todo o país até o final de 2012. Os dados sobre descargas elétricas atmosféricas nessa região já podem ser visualizados em tempo real no site da rede.
Sofia Moutinho
Ciência Hoje On-line