No momento em que se discute a reforma da previdência no Brasil, um estudo recente revela que um terço dos trabalhadores que se aposentam permanecem na ativa — e a proporção pode aumentar. A estatística é preocupante, na medida em que a tendência para os próximos anos é que cresça o número de concessões de aposentadorias e a participação desse contingente na população. Traçar um perfil desses indivíduos foi o objetivo da dissertação de mestrado em demografia defendida na Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Minas Gerais pela economista Vânia Cristina Liberato.
“Tentei construir um modelo para a oferta de trabalho ‘pós-aposentadoria’, que explicasse em que medida escolaridade, idade e valor do benefício determinam a oferta de trabalho dessa população”. Constatou-se que os ‘aposentados’ com maiores chances de permanecerem ativos são os mais jovens, os mais escolarizados e os que recebem os menores valores de benefício do INSS.
No início dos anos 1980 a taxa de atividade dos homens entre 40 e 80 anos aposentados pelo INSS era de 25%. Já em 2001, esse percentual subiu para 32%, o que representa aproximadamente 1 milhão e 700 mil trabalhadores, ou um terço dos cerca de 5,2 milhões aposentados brasileiros.
O estudo abrangeu homens residentes em regiões urbanas e se valeu de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) realizada entre 1981 e 2001. A análise mostra que, quanto mais jovem for o aposentado, maior a chance de ele ofertar seu trabalho, sobretudo no caso do trabalhador braçal, já que, ao envelhecer, o indivíduo tende a perder força física e ficar impedido de desenvolver suas atividades.
Assim, se o aposentado está em idade mais avançada, “a escolaridade torna-se crucial para a ele continuar no mercado de trabalho, uma vez que as ocupações que requerem mais alta escolaridade não demandam tanto vigor físico”, diz Vânia. Cerca de 50% dos aposentados com ensino médio completo ou mais continuam no mercado de trabalho.
Além disso, as profissões intelectuais costumam ser mais bem remuneradas à medida que aumenta a experiência, e os altos salários acabam por tornar mais caro o preço do lazer. Por isso, muitos deles optam por trocar lazer pelo trabalho após se aposentar.
Outro fator que tem condicionado o aposentado a continuar no mercado de trabalho é a compressão dos benefícios concedidos pelo INSS que, com exceção do piso de 1 salário mínimo, não vêm sendo reajustados de acordo com esse indicador. Como há uma diminuição do poder de compra, parte dos aposentados precisa continuar na ativa para complementar sua renda.
A permanência de aposentados no mercado de trabalho é problemática em um país com os baixos índices de crescimento econômico e geração de empregos como o Brasil. “A concorrência entre jovens e velhos por oportunidades de emprego é desleal”, explica Vânia. “Em profissões intelectuais os mais experientes são preferidos, enquanto que nos trabalhos braçais são os jovens que levam vantagem.”
Denis Weisz Kuck
Ciência Hoje on-line
06/06/03