Um tesouro no deserto chileno

Durante a duplicação da rodovia Pan-americana, rede de estradas que atravessa o continente, 70 fósseis de baleias com até oito metros de comprimento vieram à superfície. Entre eles, pelos menos 20 esqueletos completos do mamífero marinho foram encontrados no deserto do Atacama, no Chile, considerado o mais seco do mundo. A descoberta intrigou os pesquisadores do museu paleontológico de Caldera, comuna da região, que trabalham agora na identificação do material.

Mas há uma explicação. Segundo a bióloga brasileira Carolina Gutstein, que participa do estudo, Caldera foi, há 7 milhões de anos, um fundo marinho com alta biodiversidade.

Caldera, comuna localizada na região do Atacama, foi, há 7 milhões de anos, um fundo marinho com alta biodiversidade

O achado impulsionou os cientistas a tentar descobrir o que causou a morte desses animais e a extinção do oceano na região. “Dois fatores podem justificar a presença desses fósseis: os intensos movimentos tectônicos que marcam o Chile e as grandes transgressões e regressões marítimas do período Mioceno”, afirma Gutstein.

Os frequentes terremotos que atingem o país podem ter provocado a subida de rochas sedimentárias do fundo do oceano pré-histórico, originando um cemitério de baleias. Já o Mioceno, compreendido entre cinco e 23 milhões de anos atrás, é marcado por um intenso dinamismo, com fases de aumento e diminuição do nível do mar.

O cenário do período também é caracterizado por movimentos horizontais da crosta terrestre, como os que originaram a Cordilheira dos Andes. Com tantas mudanças no ambiente, é fácil imaginar como os mares poderiam se formar ou desaparecer no curso de alguns milhares de anos.

Carolina Gutstein em pesquisa de campo
A brasileira Carolina Gutstein participa da escavação dos fósseis de baleias e estuda a relação entre os esqueletos de golfinhos encontrados no Atacama e os que habitam a costa brasileira. (foto: Rodrigo Terreros e Jorge Arévalo)

Além de buscar a história desses fósseis, os cientistas procuram uma maneira de preservá-los. Obedecendo a lei chilena que protege monumentos nacionais, a obra da rodovia foi interrompida por mais de um ano após o achado, permitindo que a escavação fosse realizada de forma adequada.

Após a visita em novembro passado da ministra de bens nacionais Catalina Parot ao local das escavações, surgiu a ideia de se criar um museu específico para o achado, já que o prédio atual em que se encontram os fósseis – localizado na estação de trem de Caldera – corre grande risco em caso de tsunami. “Projetos dessa índole têm sido apresentados às autoridades há quase 10 anos, mas sem muito sucesso”, conta a pesquisadora, que espera que o estudo sirva como um estímulo para a construção do novo prédio.

Para registrar a memória desse tesouro paleontológico, um grupo do Instituto Smithsonian está produzindo imagens digitais dos fósseis. Com a ajuda de um scanner acoplado a um braço mecânico, eles criam fotografias em 3D altamente detalhadas, que podem ser impressas para a geração de réplicas em tamanho real.

“Além de réplicas exatas, podemos obter o posicionamento de cada um dos ossos no deserto. Essa informação, junto a outros dados, permitirá entender como se formou o acúmulo dos esqueletos de baleias, além de outros animais também encontrados, como focas e golfinhos.”

Em relação aos fósseis em si, os pesquisadores já descobriram que se trata de parentes das baleias Jubarte e Minke. O próximo passo é tentar descobrir a que espécies pertencem.

Para saber mais sobre a digitalização, veja abaixo um vídeo que mostra, além do scanner, uma pausa para o lanche durante o árduo trabalho da equipe

Mariana Rocha
Ciência Hoje das Crianças

Clique aqui para ler o texto que a CHC preparou sobre a descoberta.