Um tradutor diferente

Setenta reais e mais uns trocados. Esse é o custo final de um inovador aparelho que poderá revolucionar a educação para deficientes visuais no Brasil. Trata-se de um leitor de braile, capaz de traduzir sinais táteis da linguagem em alto-relevo para a escrita convencional. O protótipo foi desenvolvido na Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), no Paraná, e ganhou o 3º Prêmio Werner Von Siemens de Inovação Tecnológica. O grande mérito do projeto, segundo seus pesquisadores, é associar facilidade de uso, simplicidade e baixo custo.

Protótipo do equipamento desenvolvido na Universidade Estadual de Ponta Grossa (PR) para ler textos em braile e traduzi-los para a escrita convencional (foto: assessoria de comunicação / UEPG).

A boa sacada foi do atual vice-reitor da UEPG, Carlos Luciano Vargas, que, ao constatar os altos gastos da instituição com traduções de braile, pensou em desenvolver um aparelho para fazer o trabalho a custos menores. Expôs então o plano ao colega Ariângelo Hauer, do Departamento de Informática, que gostou da sugestão e não demorou a apresentar o primeiro protótipo.

“A ideia é muito simples”, diz Hauer à CH On-line. “Adaptamos uma webcam comercial, dessas comumente encontradas no mercado, a um suporte de acrílico que deixa o aparato a uma distância adequada para a focalização do texto. Uma minilanterna lança então um pequeno feixe de luz sobre os sinais em braile, gerando padrões de luz e sombra sobre o papel.”

Por meio de uma rede neural artificial (técnica de programação bastante difundida), o software projetado por Hauer identifica esses padrões e os compara com um banco de dados – traduzindo-os assim para a linguagem convencional. “Após vários testes, nossa equipe obteve um índice de 90% de precisão de leitura”, conta o pesquisador.

A equipe da UEPG já recebeu recursos para dar continuidade ao projeto. A ideia, a partir de agora, é trabalhar na produção em maior escala. “Inicialmente queremos produzir mais uns dez ou doze protótipos, para disponibilizá-los a diversas instituições do estado”, afirma Carlos Luciano Vargas .

“Queremos que o aparelho passe por um período de testes, em que os próprios professores vão dizer como podemos melhorar o protótipo.” Mesmo sendo possível incrementar o projeto com sistemas mais sofisticados de leitura digital, os pesquisadores da UEPG reconhecem que o melhor a fazer é mantê-lo da forma mais simples possível. Afinal, a ideia é que o custo final do aparelho seja acessível, para que mesmo as escolas mais pobres possam utilizá-lo sem pesar no orçamento.

Educação para cegos
“O número de estudantes com deficiência visual nas universidades brasileiras é maior do que se imagina”, ressalta Vargas. No entanto, poucas são as instituições preparadas para atendê-los – e menos ainda os professores que leem braile.

Os deficientes visuais normalmente frequentam as mesmas classes que alunos sem essa limitação. Mas, quando um estudante cego entrega uma prova ou um trabalho em braile, o professor encaminha o material para as associações locais, que irão traduzir os textos e reenviá-los ao docente. Só então as tarefas podem ser corrigidas. “Isso cria uma defasagem de tempo muito grande entre o retorno didático que o professor dá ao aluno normal e ao seu colega deficiente”, diz o vice-reitor da UEPG.

Com o novo equipamento, esse quadro vai melhorar, pois o professor poderá corrigir as atividades dos alunos cegos juntamente com as demais. Tudo o que ele precisará fazer é conectar o novo aparelho a um computador, e o conteúdo que o aluno escreveu em braile será imediatamente traduzido para um editor de texto comum.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde, existem 45 milhões de cegos no mundo. No Brasil, o número de portadores de algum tipo de deficiência visual grave é de aproximadamente 3,5 milhões.

Henrique Kugler
Especial para a CH On-line / PR
14/05/2009