Uma linguagem universal e inata

 


A análise de imagens de competições de judô dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2004 mostram que tanto os atletas que enxergam (à esquerda) quanto aqueles com cegueira congênita (à direita) fazem gestos associados à demonstração de orgulho quando vencem uma luta (fotos: Bob Willingham).

Se você está acompanhando os Jogos Olímpicos de Pequim, certamente já deve ter observado que os atletas vencedores têm uma reação parecida: erguem os braços em sinal de triunfo. Quem perde, por sua vez, costuma adotar uma postura mais encolhida, com ombros e cabeça baixos. Agora um estudo internacional sugere que esses gestos, típicos dos sentimentos de orgulho e vergonha, são respostas inatas e biológicas ao sucesso e ao fracasso, e não uma herança cultural.

Os pesquisadores chegaram a essa conclusão por meio da análise de imagens de competições de judô dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2004. O estudo, publicado esta semana na PNAS, verificou que mesmo atletas cegos de nascença – que, portanto, nunca viram as reações de outros à vitória e à derrota – também exibem espontaneamente essas expressões não verbais de orgulho e vergonha nas situações de sucesso e fracasso.

Pesquisas anteriores já haviam mostrado que as demonstrações de orgulho (como inclinar a cabeça para trás, levantar os braços ou expandir o peito) e de vergonha (como baixar os ombros e a cabeça e contrair o tórax) são reconhecidas em todas as culturas, incluindo pequenas sociedades altamente isoladas. Esses resultados sugeriam que esse comportamento é universal e, assim, inato.

No entanto, nenhum estudo havia examinado se esses gestos são feitos por pessoas cegas em situações de sucesso ou fracasso. “Nossos achados são decisivos para se defender que esses são comportamentos biologicamente inatos”, diz à CH On-line uma das autoras do artigo, Jessica Tracy, da Universidade de Columbia Britânica, no Canadá.

Influência cultural  
O grupo analisou atletas de 37 países com diferentes culturas. Entre eles, havia indivíduos com visão, cegos e com cegueira congênita (que nasceram cegos ou perderam a visão logo após o nascimento). Todos exibiram com vigor características típicas da expressão de orgulho em resposta ao sucesso.

Em relação à demonstração de vergonha em casos de fracasso, muitos dos gestos característicos foram exibidos por atletas cegos e com visão. Mas esse comportamento foi mais tímido em atletas que enxergam e vivem em culturas altamente individualistas e que valorizam a expressão pessoal, típicas da América do Norte e da Eurásia ocidental.

Para os pesquisadores, a demonstração de vergonha pode ser inibida intencionalmente por indivíduos que enxergam em função das normas culturais de seus países, que estigmatizam esse tipo de comportamento. Mas essa moderação da expressão não verbal pela cultura não acontece com pessoas com cegueira congênita.

Agora os cientistas estão examinando as funções das manifestações não verbais de orgulho e vergonha. “Nossos resultados apóiam a explicação evolutiva de que orgulho e vergonha teriam sido mecanismos poderosos para realçar ou inibir o status social de um indivíduo”, diz Tracy em comunicado à imprensa. Além disso, a equipe busca mais informações sobre a origem evolutiva dessas expressões por meio da comparação com as demonstrações de dominância e submissão de chimpanzés. 

Thaís Fernandes
Ciência Hoje On-line
11/08/2008