Vacinas do futuro

Uma pesquisa colaborativa pretende mudar o modo de se estudar a imunização contra doenças infecciosas. Financiada pela Comissão Europeia, a iniciativa reúne técnicas avançadas de 22 instituições para acelerar o desenvolvimento da próxima geração de vacinas.

O projeto ‘Tecnologias avançadas de imunização’ (Aditec, na sigla em inglês) foi descrito em edição recente da revista Science Translational Medicine. No artigo, Rino Rappuoli, biólogo do departamento de vacinas e diagnósticos da Novartis e coordenador do Aditec, explica que os métodos de imunização têm sido desenvolvidos empiricamente sem que os cientistas tenham total entendimento sobre como a vacinação protege o organismo humano de infecções.

Os métodos de imunização têm sido desenvolvidos empiricamente sem que se tenha total entendimento sobre como a vacinação protege o organismo

Dentre diversos desafios, o estudo aponta que, além de buscar novos imunizantes, é preciso caracterizar e entender como as vacinas já usadas atualmente conseguem impulsionar a atividade do sistema de defesa durante uma infecção.

Em entrevista à CH On-line, Rappuoli revela que parte importante dos esforços da equipe estará voltada a compreender as mudanças sofridas pelo sistema imunológico durante o envelhecimento. “Esse sistema envelhece assim como o resto do corpo e é preciso buscar maneiras de estimulá-lo para aumentar a qualidade de vida após os 65 anos.”

A equipe também irá avaliar o potencial profilático de uma série de substâncias para o eventual uso em futuras vacinas, entre elas a proteína hemaglutinina, presente no influenza H1N1 (vírus causador da gripe A), e a proteína H56, produzida pela bactéria causadora da tuberculose.

Bacilo de Koch
O novo projeto inclui o estudo de substâncias que poderão ser usadas nas vacinas do futuro, como uma proteína pertencente à bactéria causadora da tuberculose. (imagem: Flickr/ NIAI – CC BY-NC-AS 2.0)

Os experimentos tiveram início em outubro de 2011, portanto, ainda está cedo para apresentar resultados conclusivos. Mas Rappuoli mostra-se otimista: “Nossa equipe une desde especialistas em doenças infecciosas até pesquisadores na área da indústria de vacinas; os próximos cinco anos serão marcados por grandes resultados.”

Segundo o pesquisador, o projeto envolve tanto experimentos convencionais, como a análise do número de anticorpos necessários para que o corpo humano se defenda de um determinado vírus, quanto ensaios inovadores, em que vacinas são testadas em camundongos e humanos ao mesmo tempo.

Muito além do camundongo

Diferente do que ocorre na maioria dos estudos clínicos, o projeto propõe que substâncias candidatas à vacina não passem necessariamente por testes em animais antes de seguir para a aplicação em humanos. “A ideia é testar a vacina nos dois ao mesmo tempo”, explica Rappuoli.

Muitas substâncias são dispensadas antes mesmo da aplicação em humanos por não surtirem efeito sobre o sistema imunológico dos camundongos

O objetivo é evitar equívocos acarretados pelas diferenças intrínsecas entre o nosso sistema de defesa e o dos animais. Atualmente, muitas substâncias são dispensadas antes mesmo da aplicação em humanos por não surtirem efeito sobre o sistema imunológico dos camundongos.

Apesar de acelerar o processo de desenvolvimento das técnicas de imunização, a metodologia parece perigosa. Entretanto, Rappuoli diz que não há motivo para preocupação. As vacinas serão aplicadas em microdoses em humanos e o potencial toxicológico da dosagem terapêutica será testado primeiramente em animais.

“A capacidade tóxica das vacinas será avaliada nos camundongos, mas o uso de animais deve servir apenas como complemento aos estudos da eficácia da imunização em humanos.”

O biomédico Aguinaldo Pinto, da Universidade Federal de Santa Catarina, elogia a iniciativa e explica que o estudo paralelo em humanos e animais é seguro, além de quebrar paradigmas de um modelo de desenvolvimento de vacinas que deixa muito a desejar. “O número de vacinas que tem surgido nos últimos anos é limitado por conta de estudos em animais que não refletem a doença em humanos”, afirma.

Mariana Rocha
Ciência Hoje On-line