Vantagem brasileira contra o efeito estufa

O Brasil está em uma posição única frente aos países considerados grandes emissores de gases do efeito estufa em relação ao que pode ser feito para combater o aquecimento global. Segundo estimativas apresentadas no 1º Simpósio Brasileiro de Mudanças Ambientais Globais, realizado nos dias 11 e 12 de março no Rio de Janeiro, uma diminuição de 35% nas taxas de desmatamento atual já seria suficiente para que o país reduzisse em 20% suas emissões de gás carbônico (CO 2 ), meta que os países da União Européia se comprometeram a alcançar até 2020. Além disso, os desafios impostos pelas mudanças climáticas devem ser vistos como um incentivo ao investimento em novas formas de produção, favorecidas pela diversidade do país.

Para que o Brasil reduza em 20% suas emissões de gás carbônico, basta diminuir 35% da taxa de desmatamento atual, medida considerada de baixo custo se comparada àquelas que interferem em outros setores da economia, diz pesquisador.

A vantagem do Brasil, segundo Eduardo Viola, cientista político da Universidade de Brasília (UnB), se revela em vários aspectos. A matriz energética baseada nas hidrelétricas é um dos pontos positivos, já que se trata de uma fonte de energia renovável e pouco poluente. Outros pontos fortes são: a grande extensão do território, que permite a diversificação da produção; o elevado grau de consciência pública sobre questões relativas ao meio ambiente; e o fato de ser o desmatamento o principal emissor de gases poluentes. “A redução das emissões de CO 2 por meio da diminuição do desmatamento é considerada de baixo custo quando comparada a medidas que mexem com outros setores da economia”, diz Viola.

Mas existem desafios a serem vencidos. Ficou claro que ainda é preciso coordenar os esforços dos pesquisadores do país e integrar as diversas áreas do conhecimento. “Os cientistas sociais devem ter maior participação para que possamos entender as dimensões humanas das mudanças climáticas”, afirma Carlos Nobre, meteorologista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e membro do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).

Segundo os pesquisadores, também é preciso aproximar o conhecimento científico dos formadores de opinião e tomadores de decisão, como os representantes do governo. “Ainda há dissonância entre o discurso e a ação. O discurso se aproxima da real dimensão do problema trazido pelas mudanças climáticas, mas as ações deixam a desejar”, completa Viola. Para ele, o novo ciclo de consciência ambiental que agora se inicia facilita a superação desse obstáculo.

Coragem para uma redução voluntária
O ecólogo Carlos Joly, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), afirma que o Brasil deveria sair da defensiva e reduzir voluntariamente as emissões de carbono, ganhando, assim, força política. Viola concorda e diz que essa atitude ajudaria o país a se aproximar das grandes potências no combate às mudanças climáticas: União Européia e Japão. Ele lembra que os Estados Unidos, maior emissor de CO 2 do mundo, ainda estão na berlinda da corrida contra o aquecimento do planeta e que sua real posição só será conhecida após as próximas eleições presidenciais. “Mas qualquer presidente que seja eleito estará mais disposto do que George Bush a lidar com o problema.”

O crescente interesse dos norte-americanos no etanol brasileiro suscita preocupações. As principais dúvidas estão relacionadas às reais vantagens de um grande investimento na produção de cana-de-açúcar e à possibilidade de se fazer o plantio sem provocar a expansão da fronteira agrícola em direção a áreas de floresta preservada. O fisiologista vegetal Marcos Buckeridge, da Universidade de São Paulo (USP), propõe a criação de um selo socioambiental para a cana.

A geógrafa Berta Becker, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, defende que o Brasil busque novas formas de produção, compatíveis com o paradigma imposto pelas mudanças ambientais. “As previsões para os próximos 20 anos devem ser encaradas como uma janela de oportunidades para um país tão diverso quanto o nosso. A busca deve ser pela inovação”, sugere. Carlos Nobre acrescenta: “O Brasil deve trabalhar para ser o primeiro país tropical desenvolvido do mundo. Não há quem copiar.”

Mariana Ferraz
Especial para Ciência Hoje On-line
14/03/2007