Metanol, ácido fórmico e bicarbonato de sódio: como o equilíbrio químico entra em ação?

Instituto de Química
Universidade Federal do Rio de Janeiro

CRÉDITO: ADOBE STOCK

Nas últimas semanas, o país ficou atônito com o surto de intoxicações por metanol. É surpreendente pensar em como uma molécula estruturalmente tão simples pode ser tão nociva ao nosso organismo.

Diante desses fatos, muito se falou sobre aspectos químicos ligados ao metanol e à sua toxicidade. Entretanto, vale observarmos mais de perto algumas dessas questões e trazermos um olhar mais atento sobre como certos conceitos fundamentais da química nos ajudam a compreender os efeitos dessa substância e de seus antídotos em nosso organismo.

Um caso particularmente interessante é o uso do bicarbonato de sódio como uma das formas de tratamento para a intoxicação. Para explicar seu efeito, é preciso primeiro entender como se dá a intoxicação por metanol. 

Talvez você tenha lido que o grande vilão nessa história não é o metanol em si, mas um dos derivados do seu metabolismo: o ácido fórmico, o mesmo produzido por formigas e outros insetos para defesa e comunicação. Aliás, o nome fórmico vem de formica, que significa “formiga” em latim.

O metabolismo do metanol ocorre principalmente no fígado, por meio de uma série de reações de oxidação. A enzima álcool desidrogenase transforma o metanol em formaldeído. Em seguida, outra enzima, a aldeído desidrogenase, converte o formaldeído em ácido fórmico. Uma vez nas células, o ácido fórmico atua nas mitocôndrias, inibindo a ação de uma enzima chamada citocromo c oxidase.

Quando estudamos biologia, costumamos chamar as mitocôndrias de “usinas de energia” das células, e não à toa: nelas ocorre o processo de respiração celular, em que as células produzem energia a partir dos nutrientes, utilizando o oxigênio. A enzima citocromo c oxidase é fundamental para a conclusão desse processo e, quando é inibida, o mesmo é interrompido, levando ao que chamamos de hipóxia histotóxica, uma disfunção que aumenta a produção de ácido lático pelas células. 

A presença de ácido fórmico na corrente sanguínea e, principalmente, o aumento da produção de ácido lático pelas células, levam ao aumento da acidez do sangue (ou a redução do pH), um processo chamado acidose, que apresenta inúmeras consequências nocivas ao organismo. Outros venenos, como o cianeto (o preferido da escritora de romances policiais Agatha Christie!) e o monóxido de carbono, também atuam inibindo a citocromo c oxidase e levam à morte por mecanismos semelhantes.

Uma das medidas para mitigar os efeitos do ácido fórmico é a administração de bicarbonato de sódio na corrente sanguínea. Por ser uma substância de caráter básico, em primeiro lugar, ela corrige os efeitos da acidose, elevando o pH do sangue. Porém, seu efeito mais importante se dá ao reagir com o ácido fórmico, em uma reação de neutralização, que leva à formação de um sal, o formiato de sódio. O ácido fórmico tem a capacidade de difundir-se rapidamente pelos tecidos do corpo, passando inclusive pela barreira que protege o sistema nervoso central. Ele entra com facilidade nas células e provoca os efeitos nocivos discutidos anteriormente. Porém, na forma de sal, o formiato, por ter carga negativa, tem mais dificuldade de penetrar nos tecidos, visto que substâncias com cargas não se difundem com facilidade pela membrana celular. Além disso, o formiato de sódio é eliminado com maior facilidade pela urina, o que também representa uma vantagem.

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