Entrevista: Wendelin Werner – Das chuteiras aos números

O matemático Wendelin Werner (foto cedida pelo entrevistado).

Ele imaginou para si um futuro igual ao sonhado por milhões de crianças no mundo: ser jogador de futebol. Caso isso desse errado, havia uma segunda opção: comentarista esportivo. Mas, em seu caso, as probabilidades parecem ter jogado contra. E a vida determinou que aquele garoto deveria labutar não com pés nas chuteiras, mas sim com a extremidade oposta do corpo: o cérebro. Em vez de gols e jogadas vistosas – em tempo: aos 14 anos, ele participou de um filme francês no qual a atriz Romy Schneider (1938-1982) interpretou seu último papel –, sua fama haveria de brotar dos números, dos símbolos e das equações.

Aos 39 anos de idade, o franco-germano Wendelin Werner, professor da Universidade de Paris Sul, em Orsay, é ganhador da medalha Fields, um ‘Nobel’ da matemática dado, a cada quatro anos, a pesquisadores com até 40 anos de idade. Ele sabe que comenda tão prestigiosa cobra seu preço. “Sempre querem saber minha opinião sobre vários temas, e ela agora vale mais do que antes; por isso, tenho que ter cuidado com o que digo” (não seria muito diferente caso ele tivesse sido eleito, por exemplo, o melhor jogador do mundo pela Fifa).

Em entrevista exclusiva à Ciência Hoje, Werner diz-se apenas uma pessoa comum. Nem gênio misterioso, nem um sujeito desajustado para a vida. “Não é necessário ser assim para se estudar matemática.”

Sempre se imagina que matemáticos profissionais foram crianças estudiosas que não tinham tempo para esportes ou atividades sociais. Esse foi o caso do senhor?
Não, como muitas pessoas aqui no Brasil, meu objetivo quando criança era ser jogador de futebol e, se não conseguisse isso, ser um comentador esportivo. Não passava o tempo todo lendo ou estudando. Era uma criança como as outras.

Em 2006, o senhor recebeu a medalha Fields, considerada o Nobel da matemática, por seu trabalho com probabilidades. Quando pensamos nesse campo, sempre imaginamos coisas relacionadas a jogos de azar ou teoria dos jogos. Sua pesquisa está relacionada com isso?
É verdade que a teoria da probabilidade, como campo de estudo da matemática, é inspirada pelos fenômenos aleatórios que observamos ao nosso redor, mas ela não se reduz a isso. Assim como outras áreas da matemática, é um estudo sobre conceitos abstratos e não especificamente sobre uma aplicação. Portanto, apesar de meu trabalho estar relacionado a isso, ele não aborda esse tema apenas, mas sim as suas relações com outras áreas da matemática.

Por outro lado, meu trabalho de pesquisa é inspirado por questões da física, em particular da chamada física estatística. Estudei sistemas como os gases, que são compostos de várias partículas que se movimentam de maneira aleatória. Em minha pesquisa buscava compreender o comportamento desse estado da matéria. O interessante é que, em certos casos, como em duas dimensões, ou seja, em um plano, esse sistema tem conexão com outros conceitos matemáticos.

Receber esse prêmio mudou algo em sua vida? O senhor agora se sente pressionado a só publicar trabalhos de altíssimo nível?
Por um lado, sim – as expectativas são maiores –, mas, por outro, não. As pessoas com quem trabalho discutem questões matemáticas comigo e não conceitos como pressão [para publicar artigos] ou reconhecimento [público]. Obviamente, a comunidade fica feliz quando alguém de seu meio é reconhecido, mas o dia-a-dia continua o mesmo.

O que muda realmente é a relação com o público em geral. As pessoas que não sabem o que fazemos pensam que a medalha Fields é o objetivo final de minha vida acadêmica. É bom ser reconhecido, mas há vários outros matemáticos que podiam ter ganhado esse prêmio. Além disso, agora tenho outras responsabilidades, como dar entrevistas, porque o foco nessas premiações é importante e permite falar sobre matemática para os leigos.

Também tenho consciência de que não posso usar essa fama para fazer coisas que antes não poderia. Sempre querem saber minha opinião sobre vários temas, e ela agora vale mais do que antes, por isso tenho que ter cuidado com o que digo.

Para fazer trabalhos de pesquisa, o melhor é não ter outras responsabilidades, que é exatamente o contrário da minha situação atual.

Fred Furtado e
Cássio Leite Vieira
Ciência Hoje/RJ 

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