Fica tentador comparar uma molécula encontrada no sangue de jovens com o elixir da juventude. Afinal, essa proteína foi capaz de reverter o envelhecimento em idosos, chegando a reparar danos no material genético e criar novas células no cérebro. Promissora, sem dúvida.

Para humanos, as esperanças começam a esmaecer a partir daqui: os resultados acima foram obtidos com camundongos. Mas não se esvaem totalmente: há chance de tal proteína prover os mesmos benefícios no Homo sapiens.

Dois artigos publicados na revista Science trazem resultados de um mesmo experimento (estranho, é verdade): juntar o sistema circulatório de dois indivíduos – no caso, um jovem e outro idoso – por meio da costura da pele de ambos. Esse procedimento é chamado parabiose e praticado em animais desde o século 19. E, com base nele, já se sabia que esse método reverte sinais de envelhecimento no animal mais velho.

Por quê? A provável resposta veio agora: GDF11. Traduzindo: proteína cuja sigla (em inglês) significa fator de diferenciação de crescimento. Sabe-se que essa molécula regula a atividade das células-tronco, que podem se transformar em outras células do organismo. Mais: o GDF11 é abundante em camundongos jovens e deficiente em idosos.

Ano passado, mostrou-se que essa proteína tinha ação antienvelhecimento no coração. Agora, efeitos semelhantes foram comprovados para músculos e cérebro.

Nos dois estudos, há evidências de que o GDF11 leva as células-tronco a se tornarem células adultas – no caso, de músculos e do cérebro

Em um dos estudos, o grupo liderado por Amy Wagers e Lee Rubin, da Universidade Harvard (EUA), observou que injeções diárias de GDF11, por um mês, melhoravam a força e a estrutura dos músculos em camundongos idosos em condições semelhantes às obtidas pela parabiose. No outro experimento, mostrou-se que o mesmo procedimento fez com que o cérebro produzisse novos neurônios – no caso, relacionados ao olfato.

Nos dois casos, há evidências de que o GDF11 leva as células-tronco a se tornarem células adultas – no caso, de músculos e do cérebro.

A Universidade Harvard já pediu a patente do GDF11, e Wagers disse para a revista Science que já se discute o uso do fator em casos de Alzheimer e doenças cardíacas. A mesma reportagem informa que, até agora, só a droga rapamicina e a chamada dieta de restrição calórica tinham efeitos semelhantes aos do GDF11. Mas este último tem a vantagem de ser uma substância naturalmente produzida pelo organismo.

Transfusão jovial

No periódico Nature Medicine,  foi publicado estudo semelhante – mas que não identificou o fator de crescimento – mostrando que a transfusão de sangue de camundongos jovens para idosos melhorou o aprendizado e a memória nestes últimos. Segundo os autores, isso parece ter ocorrido por conta de um rejuvenescimento no hipocampo, área do cérebro onde memórias são armazenadas.

Problema com o GDF11: não se sabe muito sobre seu mecanismo de ação. Assim, pouco adiantaria reverter o envelhecimento, usando essa molécula, e causar efeitos colaterais como doenças graves ou mesmo a morte. E, claro, há uma questão essencial: aumentar a quantidade desse fator em um organismo idoso daria sobrevida ao paciente?

Isso deve começar a ser respondido com os testes do GDF11 em humanos, daqui a uns três ou cinco anos.

Lembrete comum na seção Mundo de Ciência da Ciência Hoje. O GDF11 pode atolar em alguns dos muitos buracos (profundos) da estrada das boas intenções, cujas margens contêm túmulos (igualmente profundos) de várias promessas anteriores na área de medicina.

Cássio Leite Vieira
Ciência Hoje/ RJ

Texto originalmente publicado na CH 316 (julho de 2014). Clique aqui para acessar uma versão parcial da revista.

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