
A presença dessa gordura em batata-palha vendida em pacote no município de Curitiba foi investigada pela farmacêutica Cristina Winter, e o resultado dos estudos está em sua dissertação de mestrado, defendida no Programa de Pós-graduação em Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Winter analisou 20 diferentes marcas do produto e pretende, com esse trabalho, montar um banco de dados que ajude a superar a falta de informações técnico-científicas sobre gorduras trans em diferentes alimentos disponíveis no mercado brasileiro.
O teor de gordura trans de um produto depende, segundo Winter, da quantidade de gordura vegetal hidrogenada em sua composição. Com menos colesterol e menos gordura saturada, a gordura hidrogenada surgiu como alternativa à gordura animal. Como no mundo vegetal não há gorduras, só óleos, estes são transformados em gordura sólida, sob alta pressão e temperatura, pelo processo de hidrogenação, que pode se dar naturalmente (como no rume de animais) ou por processo industrial. Neste último, ocorre modificação estrutural (isomeria) dos ácidos graxos, que passam da forma cis para trans . “A gordura hidrogenada, antes líquida, recebe um hidrogênio na cadeia de carbonos de sua molécula, o que a solidifica”, descreve Winter. “Na prática, isso é feito para deixar a batata-palha mais crocante, saborosa e menos oleosa.”
Após extração da gordura total das amostras de batata-palha selecionadas, foram feitas análises para verificar sua composição nutricional geral (carboidratos, proteínas, calorias etc.) e para identificar e quantificar os diferentes tipos de gordura (ácidos graxos saturados, monoinsaturados, poliinsaturados e trans ). “A soma dessas substâncias, mais ômega-3, corresponde ao valor da gordura total”, explica a farmacêutica.
Os índices de gordura total obtidos nas amostras (entre 35% e 47%) estão próximos aos encontrados nas batatas chips (37%). No caso da gordura trans , o percentual médio detectado foi de 17%. Das 20 amostras analisadas, só duas não a apresentaram (figura). “Nesses casos o fabricante substituiu a gordura hidrogenada por óleo de palma e outros óleos vegetais ou equilibrou a parte sólida da gordura trans com sua parte líquida (vegetal)”, diz Winter.
Novas orientações técnicas
O consumo excessivo de alimentos ricos em gordura trans reduz a taxa do chamado bom colesterol (HDL) e aumenta a do colesterol ruim (LDL). Para a farmacêutica, a simples leitura do rótulo dos produtos alimentícios é suficiente para o consumidor verificar se os itens que pretende adquirir contêm ou não ácidos graxos trans . As informações sobre a natureza nutricional dos alimentos são, segundo ela, fundamentais para uma alimentação saudável.
Com o objetivo de beneficiar o consumidor e oferecer orientação técnica às empresas do setor alimentício, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou em 2003 uma resolução que regulamenta normas técnicas para rotulagem nutricional de alimentos embalados. Entre os ajustes a serem feitos pelo setor ainda este ano, destacam-se a indicação do teor de gordura trans no rótulo que traz a relação de nutrientes do alimento e a redução (de 2,5 mil calorias para 2 mil calorias) do Valor de Referência Diária (%VD) da quantidade de calorias a ser ingerida diariamente por um adulto saudável.
Todos os rótulos das amostras analisadas estavam em desacordo com pelo menos um dos itens revistos pela resolução da Anvisa. Outro problema é que os rótulos só declaram gorduras trans em gramas, sem indicar o valor máximo de consumo diário (%VD), devido à falta de estudos em âmbito mundial. Para as gorduras total e saturada, esses percentuais já foram definidos (55 g e 22 g, respectivamente, para uma dieta de 2 mil calorias diárias). Mas a Organização Mundial de Saúde recomenda consumo máximo de 1% de gordura trans em uma dieta de 2 mil calorias.
Ivan Sebben
Especial para Ciência Hoje / PR