Alimentação ecologicamente correta

Comer cereal no café-da-manhã pode ajudar a acabar com o desperdício na produção de arroz? E matar o tempo saboreando aperitivos salgados pode dar um destino às cascas de camarões, hoje consideradas rejeitos poluentes pela indústria pesqueira? Por mais estranho que pareça, a resposta para as duas perguntas é sim. Pelo menos segundo as pesquisas da química Cristina Tristão de Andrade, do Instituto de Macromoléculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O grupo da pesquisadora já produziu cereais à base de grãos quebrados de arroz e agora estuda uma forma de encapsular vitamina A nesses alimentos, utilizando envoltórios fabricados à base de quitosana, polissacarídeo obtido a partir da casca de camarões.

Em geral, iguarias e cereais industrializados são feitos de amido de milho e produzidos por um processo conhecido como extrusão, que transforma a farinha em uma massa moldável e serve para reduzir a contaminação microbiana e desativar certas enzimas. Ele envolve diversas operações como mistura, compressão, estiramento e cozimento dos grânulos. Os grãos quebrados de arroz usados na pesquisa em substituição ao milho são um subproduto do processo de beneficiamento do arroz e seu preço é cerca de um terço o dos grãos normalmente usados. Flocos doces, feitos desse material, já foram fabricados em 2004 por uma das alunas de mestrado de Tristão, a nutricionista Marcia Cristina da Silva, do Instituto de Química da UFRJ.

O grupo, agora, tenta enriquecer os produtos finais com vitamina A. Como o processo de extrusão destrói essa vitamina, muito sensível à presença de luz e de oxigênio, os pesquisadores estão tentando resolver o problema usando quitosana (um polímero derivado da quitina, composto orgânico encontrado em abundância na casca dos camarões), para encapsular o nutriente.

A idéia é adicionar as cápsulas à farinha (os grãos de arroz moídos) antes da extrusão e assim gerar uma massa final rica em vitamina A. A encapsulação de substâncias já é usada na indústria alimentícia para proteger vitaminas ou compostos aromáticos sensíveis á luz, ao calor ou ao ar. O plano de Tristão é criar flocos de cereais matinais que contenham metade da quantidade diária de vitamina A necessária para crianças entre quatro e 10 anos, 250 a 350 microgramas. Já os aperitivos serão produzidos com mais vitamina A, pois serão direcionados aos adultos, que têm uma necessidade diária da vitamina maior que as crianças (1.000 microgramas).

Os cereais e aperitivos em desenvolvimento podem representar benefícios ecológicos e econômicos, pois agregam valor aos grãos quebrados de arroz e dão uma utilidade às cascas dos camarões. “Podem, também ajudar a combater as deficiências alimentares de crianças que não têm acesso a leite, ovos e fígado”, explica Tristão. “Elas em geral apresentam deficiência de vitamina A e a complementação tem se mostrado fundamental no combate à mortalidade infantil”. A pesquisadora espera que até o fim do ano cereais ricos em vitamina e próprios para o consumo já possam ser produzidos.

Marcelo Garcia
Ciência Hoje/RJ.

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