O filme supercondutor (área escura) permite melhor condução da eletricidade e menor perda de energia (foto: Grupo de Vidros e Cerâmicas do Departamento de Física e Química/Unesp).

Pesquisadores brasileiros conseguiram produzir de maneira barata um filme – película com espessura de alguns micrômetros (1 micrômetro equivale a um milionésimo de metro) – que, em temperaturas de -193 o C, adquire propriedades supercondutoras. O feito é substancial, já que materiais supercondutores só apresentam essas características em temperaturas próximas ao zero absoluto (-273 o C) e sua manufatura envolve centenas de milhares de dólares.

Os cientistas do Grupo de Vidros e Cerâmicas do Departamento de Física e Química da Universidade Estadual Paulista (Unesp), responsáveis pela conquista, utilizaram o filme para substituir o cobre da composição de circuitos impressos (placas onde são fixados componentes eletrônicos), obtendo melhor eficiência na transmissão de energia elétrica.

Os supercondutores pertencem a uma das quatro classes de materiais existentes no que se refere à condução de corrente elétrica. As outras são a de condutores, substâncias que conduzem bem a eletricidade, como os metais em geral, a de semicondutores, que apresentam mais resistência à passagem da corrente, e a de isolantes, que impediriam o fluxo elétrico. Essa característica, que existe também nos condutores, só que em menor grau, é responsável pela perda de energia durante a transmissão. “Em vez de transmitir a energia, o material a converte em calor (efeito Joule), como acontece nos chuveiros elétricos”, explica o físico Cláudio Luiz Carvalho, membro do Grupo de Vidros e Cerâmicas e chefe da linha de pesquisa do filme.

Já com os supercondutores, a perda é extremamente pequena. Segundo Carvalho, linhas de transmissão construídas a partir desse material reduziriam a perda de energia em 90%, eliminando a necessidade de subestações que reforçassem a corrente transmitida de uma usina hidrelétrica para uma cidade. Os supercondutores também podem ser usados para medir pequenos ou gerar grandes campos magnéticos, como nos exames de ressonância magnética. “No Japão já se testam trens que viajam a grandes velocidades por levitarem sobre os trilhos, outro fenômeno mediado por esse tipo de material”, comenta o físico.

Velocidade no processamento
Carvalho começou a trabalhar nessa área em 1990 e se concentrou na produção de filmes em 1999. Segundo o físico, o principal campo de aplicação para essas películas é a eletrônica, onde o uso dos supercondutores aumentaria, por exemplo, a velocidade de processamento do sinal e reduziria o problema de aquecimento dos dispositivos. Foi essa a motivação que levou os pesquisadores a substituir o cobre utilizado nas trilhas dos circuitos impressos pelo filme supercondutor.

Embora a praticidade de um material que funciona a temperaturas tão baixas possa ser questionada, o físico destaca que certos ambientes, como a Lua, por exemplo, estão muito abaixo de zero. Além disso, não é muito difícil manter os supercondutores nessas temperaturas, pois o resfriamento é relativamente barato hoje, já que o nitrogênio líquido, usado para esse fim, custa centavos de dólar. “Mas a idéia é, no futuro, fazê-los operar em temperatura ambiente”, esclarece.

O sucesso do experimento não é a única vitória do grupo, que também conseguiu produzir a película por apenas US$ 100. Quando comparada com metodologias estrangeiras que podem chegar a US$ 500 mil, a técnica brasileira parece promissora. “O preço dos outros processos é alto porque eles requerem máquinas e insumos especiais, os quais conseguimos duplicar de outra maneira. Além disso, são processos de escala industrial”, conta Carvalho.

O Grupo de Vidros e Cerâmicas pretende agora aumentar a potência da corrente transmitida pelo filme e reduzir sua espessura. A idéia é, até o fim do ano, construir um dispositivo com componentes que utilizem a película e cujo funcionamento envolva o efeito Josephson, também conhecido como efeito de tunelamento. Nele, um elétron é capaz de ir de um ponto a outro – no caso, de um supercondutor a outro – passando por um meio isolante entre eles. “Um equipamento que utilizasse esse fenômeno teria um alto desempenho. Um computador, por exemplo, realizaria operações muito mais rapidamente que as máquinas convencionais”, ressalta.

Fred Furtado
Ciência Hoje/RJ.

 

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