Guseiras na Amazônia: perigo para a floresta

Conjunto de fornos do tipo ‘rabo-quente’ no sudeste do Pará. (Foto: Alfredo Homma)

O início, há cerca de 3.200 anos, da Idade do Ferro, que se seguiu às idades da Pedra e do Bronze, representou um grande avanço na história humana. O domínio da metalurgia levou à fabricação de novas ferramentas para agricultura e armas mais modernas, que permitiram a expansão territorial de diversos povos. No Brasil, a primeira fundição foi estabelecida entre 1587 e 1597, pelo bandeirante Afonso Sardinha, na região de Sorocaba, mas só após a vinda de D. João VI para o Brasil, em 1808, a indústria siderúrgica de fato se desenvolveu. Sua consolidação, porém, só aconteceria entre 1950 e 1960, nos governos dos presidentes Getúlio Vargas (1883-1954) e Juscelino Kubitschek (1902-1976).

Na Amazônia, a implantação das guseiras (empresas que transformam o minério em ferro-gusa, matéria-prima para a produção de aço), a partir de 1988, em Carajás, onde foram descobertas jazidas de ferro, tornou-se um perigo ambiental de enormes proporções nos estados do Pará e do Maranhão, por onde passa a ferrovia de Carajás. Repete-se nessa região o ciclo de destruição da vegetação nativa, ocorrido no cerrado, para a produção de carvão vegetal. Do total de ferro-gusa produzido, 95% são usados na produção de aço bruto e 5% na de fundidos de ferro, e 18% dessa produção destina-se à exportação.

O problema surge porque, para obter 1 tonelada de ferro-gusa, a guseira precisa, em média, de 1,6 tonelada de minério de ferro e 875 kg de carvão vegetal, além de calcário (100 kg), manganês (40 kg) e quartzito (65 kg). Na produção do ferro-gusa podem ser usados tanto o carvão mineral quanto o vegetal, mas este se destaca pela reduzida quantidade de enxofre. Atualmente, estão em funcionamento, no chamado Pólo Carajás, sete usinas (com 19 altos-fornos) no Maranhão e oito usinas (18 altos-fornos) no Pará, e todas obtêm ferro-gusa usando carvão vegetal, o que significa uma imensa pressão sobre a vegetação nativa, já que o reflorestamento existente, com espécies madeireiras destinadas à produção de carvão, é insuficiente.

A produção brasileira de ferro-gusa (são 69 empresas, com 137 altos-fornos instalados) divide-se entre a de usinas siderúrgicas integradas (que também produzem aço) e a de empresas independentes (gusa para fundição e aciaria). As primeiras respondem por 71,2% do total produzido e as independentes por 28,8%. Essa fatia menor distribui-se hoje entre Minas Gerais (63%), Pólo Carajás (31%), Espírito Santo (5%) e outros estados (1%). Quase toda a produção de Carajás (88%) é exportada para os Estados Unidos, enquanto as de Minas Gerais e Espírito Santo dividem-se entre os mercados interno e externo — cerca de 90% do ferro-gusa comercializado no país é oriundo de Minas Gerais. Da produção total de ferro-gusa no país, 66,8% envolvem o uso de carvão mineral e 33,2% de carvão vegetal.

Os 15 produtores de ferro-gusa do Pólo Carajás produziram e exportaram (em números acumulados até 2005) mais de 20 milhões de toneladas de ferro-gusa. A exportação, feita pelos portos de Ponta de Madeira (MA) e Barcarena (PA), atingiu mais de 3 milhões de toneladas no ano passado.

Estudos realizados na região do sudeste do Pará, entre 1999 e 2004, pela Embrapa Amazônia Oriental, uma das unidades de pesquisa da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, com recursos do Projeto de Apoio ao Desenvolvimento de Tecnologia Agropecuária para o Brasil (Prodetab), mostraram que a derrubada de florestas densas nos projetos de assentamentos, a extração de madeira (com a destruição de áreas de ocorrência da castanha-do-pará) e a implantação de roças (seguidas da formação de pastagens) estão relacionadas ao aproveitamento da madeira para a produção de carvão vegetal. Apesar da justificativa de que a madeira resultante das derrubadas e de restos de serrarias seria queimada de qualquer modo, e de que a produção de carvão vegetal evitaria a combustão total da madeira (diluindo ao longo do ano a emissão de gás carbônico para a atmosfera), promove-se uma destruição irresponsável dos recursos florestais e de graves conseqüências para o equilíbrio do ecossistema da região amazônica.

Alfredo Kingo Oyama Homma,
Raimundo Nonato Brabo Alves,
Antônio José E. Amorim de Menezes
e
Grimoaldo Bandeira de Matos
Embrapa Amazônia Oriental

Você leu apenas a introdução do artigo publicado na CH 233.
Clique no ícone a seguir para baixar a versão integral (660 KB) Arquivo de formato PDF. Pode ser aberto com o Adobe Acrobat Reader. Baixe gratuitamente de http://www.adobe.com/

Outros conteúdos desta edição

Outros conteúdos nesta categoria

614_256 att-22975
614_256 att-22985
614_256 att-22993
614_256 att-22995
614_256 att-22987
614_256 att-22991
614_256 att-22989
614_256 att-22999
614_256 att-22983
614_256 att-22997
614_256 att-22963
614_256 att-22937
614_256 att-22931
614_256 att-22965
614_256 att-23039