Estudos epidemiológicos feitos há mais de uma década em várias partes do mundo têm apontado uma relação entre consumo de peixe e baixa incidência de casos de depressão. No Japão, Coréia e Chile, onde o consumo do alimento é elevado, essa incidência é consideravelmente menor que a observada em países como Alemanha ou Estados Unidos, cuja população ingere menos peixe e derivados.

Esses resultados foram corroborados por pesquisas do Departamento de Fisiologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR) que mostraram que ácidos graxos poli-insaturados da família ômega-3, presentes no óleo de peixe, reduzem a depressão. O estudo foi realizado com um grupo de portadores da doença de Parkinson, que sofrem de depressão em 50% dos casos.

O óleo extraído de peixes contém ômega-3 (foto: sxc.hu).

“A introdução do óleo de peixe na alimentação dos portadores de Parkinson que acompanhamos revelou-se boa opção terapêutica para combater a depressão, principalmente por ser um suplemento com poucos efeitos colaterais”, disse a fisiologista Anete Curte Ferraz, coordenadora do estudo, realizado em parceria com a Associação Paranaense de Portadores de Parkinsonismo. “O produto é especialmente indicado para pacientes mais idosos que fazem uso de vários medicamentos”, ressaltou Ferraz.

Os ácidos graxos da família ômega-3 podem ser encontrados em maior concentração em peixes e outros animais marinhos com elevado teor de gordura, especialmente os procedentes de regiões frias, como o salmão, a sardinha e o atum. Nozes e linhaça também são fontes da substância.

O óleo de peixe, como a maioria dos lipídios (gorduras), possui ácidos graxos em sua estrutura. Essas substâncias – principalmente os ácidos docosahexaenoico e eicosapentanoico, que participam de processos bioquímicos importantes – estão presentes na membrana dos neurônios e são necessárias para o desenvolvimento e o funcionamento de certas células do cérebro.

A dieta do mundo ocidental mudou drasticamente após a Revolução Industrial, quando houve aumento da ingestão de gordura saturada e trans, de ácidos graxos da família ômega-6, e redução dos ácidos graxos da família ômega-3. “Como consequência, o índice de neuropatologias associadas a essa modificação de hábitos alimentares aumentou”, disse a fisiologista. Mas estresse, alcoolismo e consumo elevado de nicotina e cafeína podem reduzir os níveis de ácidos graxos no organismo, agravando ou mesmo produzindo doenças.

Resultado expressivo
Os 31 portadores de Parkinson com depressão que participaram da pesquisa, ao longo de três meses, foram separados em dois grupos: um recebeu placebo (formulação farmacêutica sem atividade) e o outro foi tratado com uma suplementação de óleo de peixe. Alguns pacientes usavam antidepressivos há mais de um ano sem obter os efeitos desejados e outros não tomavam nenhum tipo de droga.

O resultado dos testes mostrou redução de 50% dos sintomas depressivos em 42% dos pacientes que consumiram óleo de peixe. “Só 6% dos que receberam placebo apresentaram redução expressiva da depressão”, contou Ferraz. Como o número de voluntários que participaram do estudo é pequeno, não se pode, segundo ela, generalizar os dados obtidos para toda a população de parkinsonianos. “Mas eles apontam um resultado importante”, destacou.

O mecanismo de ação antidepressiva do ômega-3 presente no óleo de peixe ainda é desconhecido, e a equipe da UFPR pretende avaliá-lo na próxima etapa do estudo. Isso será feito a partir do uso de modelos animais e por meio da análise do sangue de pacientes.

A doença de Parkinson
O mal de Parkinson é uma doença neurodegenerativa que destrói os neurônios dopaminérgicos, que produzem uma substância responsável por transmitir impulsos relacionados com os movimentos musculares. Cerca de 1% da população mundial é acometida pela doença, e sua causa permanece desconhecida. Calcula-se que 10% dos casos sejam de origem genética. Qualquer que seja a causa da doença, ela só é diagnosticada quando cerca de 60% dos neurônios que produzem dopamina estão degenerados e os níveis da substância ficam reduzidos a 20%.

Os sintomas motores mais comuns são tremor, rigidez muscular e alterações posturais. Entretanto, manifestações não motoras também podem ocorrer, como comprometimento da memória, depressão, alterações olfativas e distúrbios do sono. A prevalência da doença de Parkinson na população é de 150 casos por 100 mil habitantes, e a cada ano surgem 20 novos casos por 100 mil habitantes.

Depressão
A depressão afeta cerca de 120 milhões de pessoas no mundo. Ela tornou-se bastante comum no século 20, e há estimativa de que uma em cada quatro pessoas vai sofrer algum transtorno neurológico durante a vida. A Organização Mundial da Saúde estima que a depressão será, por volta de 2020, a segunda maior causa de incapacidade na população de países desenvolvidos e a primeira causa nos países em desenvolvimento.

A frequência da depressão na doença de Parkinson é elevada e, apesar do tratamento medicamentoso e psicoterapêutico, tende a reaparecer algum tempo após um primeiro acometimento. Isso se explica pela deficiência de dopamina, responsável por dificuldades motoras, e, em menor grau, de noradrenalina e serotonina, responsáveis pelo humor. Tais alterações na bioquímica do cérebro predispõem o paciente de Parkinson à depressão como doença subjacente. Além disso, pessoas que sofrem de depressão são três vezes mais propensas a desenvolver a doença de Parkinson.

Embora o estudo da UFPR tenha verificado a ação do óleo de peixe para combater a depressão em portadores da doença de Parkinson, os pesquisadores acreditam que os ácidos graxos poli-insaturados da família ômega-3 possam ser efetivos contra a depressão causada por quaisquer circunstâncias. “Mas os efeitos do suplemento alimentar são temporários; perduram apenas enquanto são consumidos”, ressalta a coordenadora do estudo.

Luan Galani
Especial para Ciência Hoje / PR

 

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