No início da noite, ele estava sentado à mesa do restaurante, a aguardar por ela. Seria o primeiro encontro. Os minutos passavam lentamente e, a cada avanço do ponteiro no relógio, um novo pensamento surgia: “E se ela não vier?”; “Será que foi porque eu marquei aqui e não onde ela sugeriu?”; “Será que não gosta de mim?”; “E se desistiu?”.
Às 18h35, ele olha para o celular, ávido por uma ligação ou mensagem, e descobre que seu chefe havia telefonado há cinco minutos. Novos pensamentos se sucedem: “Será que o relatório não ficou bom?”, “Se eu não for promovido, o que direi aos meus amigos?”.
Então, o que era um leve frio na barriga, comum em todo primeiro encontro, se torna progressivamente uma avalanche de sensações de desconforto: boca seca, suores, tremores, vertigem. Ao sair em disparada pela porta do restaurante, determinado a voltar para o escritório, nem percebe que acaba de passar pela bela jovem que, por causa de um grande engarrafamento, dirigia-se apressada ao local do encontro.
Situações como essa ocorrem em nossas vidas a todo momento, mas nem todos nós as vivenciamos como se fossem grandes ameaças. Grande parte das pessoas, porém, de fato vê o mundo como um local inseguro e as pessoas como perigosas, o que leva a drásticas reduções em sua qualidade de vida. Essas pessoas sofrem, provavelmente, de algum transtorno de ansiedade.
A ansiedade é um estado mental que se manifesta na antecipação de uma ameaça potencial ou iminente. Embora possa ser necessária, em vários momentos de nossas vidas, como um mecanismo de defesa, a ansiedade excessiva ou os transtornos de ansiedade podem tornar o mundo sombrio e assustador.
Este artigo descreve os transtornos de ansiedade, suas causas e os tratamentos disponíveis, relacionando essas informações com as pesquisas sobre o assunto realizadas no Brasil e no mundo.
Necessária até certo ponto
Sensações de ansiedade são, normalmente, parte da experiência humana, mas a ansiedade excessiva, frequente ou inapropriada pode levar a doenças. Esse estado mental é acompanhado por respostas comportamentais e fisiológicas que incluem evitar as situações temidas, manter-se em alerta e apresentar ativação do sistema nervoso autônomo, responsável por funções automáticas, como respiração, circulação sanguínea e outras. Tais respostas visam a proteger o indivíduo do perigo.
As respostas relacionadas à ansiedade têm sido descritas em humanos e em animais e fazem parte de um mecanismo universal de adaptação dos organismos a condições difíceis. É fácil imaginar como se reduziriam as chances de sobrevivência de uma presa que não tivesse medo de seu predador – um suricato não ter medo de uma águia aumentaria muito as chances de ele virar o jantar da águia. Ter ansiedade, portanto, é necessário e importante, mas até certo ponto.
Os especialistas a dividem em duas categorias: o ‘estado de ansiedade’, que seria uma resposta imediata ou aguda frente a alguma situação, como termos medo de cobra ou de um assalto quando nos deparamos com esses estímulos ou situações. E o ‘traço de ansiedade’, uma característica de personalidade mais permanente que indica uma tendência da pessoa para ter, ao longo do tempo, um aumento na resposta de ansiedade.
A ansiedade é considerada doença quando interfere gravemente na vida cotidiana, e pode ser classificada em seis síndromes, segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV, na sigla em inglês), elaborado pela Associação Americana de Psiquiatria e utilizado em todo o mundo: transtorno de ansiedade generalizada, fobia social, fobia específica, transtorno de pânico, transtorno de estresse pós-traumático e transtorno obsessivo-compulsivo. Juntos, esses transtornos afetam cerca de 23% dos brasileiros em algum momento de suas vidas.
Anna Claudia Silveira e Antonio Egidio Nardi
Instituto de Psiquiatria
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Gisele P. Dias, Mário Bevilaqua e Patrícia Franca Gardino
Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho
Universidade Federal do Rio de Janeiro