Não se sabe ao certo quando surgiu o conceito de perfume, cuja palavra deriva do latim per fumun ou pro fumun, que significa ‘através da fumaça’. Mas a história da perfumaria parece ter se iniciado antes das civilizações mesopotâmicas, consideradas o berço da humanidade e nas quais foram descobertos os primeiros recipientes para o acondicionamento de incensos, a versão inicial dos perfumes.
Em registros da Idade da Pedra, observa-se a presença de colares ornamentais, estatuetas femininas e pinturas rupestres com o uso de corantes, que ressaltam a importância da mulher como o ser da fertilidade e da beleza. No Neolítico – entre 7 mil e 2,5 mil a.C., no fim da Idade da Pedra –, o cultivo da terra, o desenvolvimento da cerâmica e o uso dos metais são indícios de que o ser humano se fixou e passou a viver ao redor da família.
De caçador nômade, foi alçado a ser coletivo, condição que exigiu dele se apropriar da racionalidade e de outras capacidades e estratagemas para conquistar o espaço comum. Nesse contexto, é razoável imaginar que os humanos fizeram uso da natureza não só para se alimentar e manter a prole, mas também com fins mais utópicos.
A história da Antiguidade revela que os materiais relacionados à perfumaria serviam a fins religiosos, bem como ao embelezamento e à alimentação, além de serem empregados para tratamento da saúde.
Rumo aos deuses
As primeiras sociedades da Mesopotâmia compreendiam que queimar incensos lhes facilitaria o caminho à vida eterna. A fumaça liberada pela queima de resinas, exsudatos, cascas e outras matérias orgânicas era a via de contato entre os humanos e os deuses, a quem eram oferecidas oferendas.
- Em fragmento da decoração de um túmulo egípcio, observa-se a fabricação de perfume de lírio. As primeiras sociedades da Mesopotâmia compreendiam que queimar incensos lhes facilitaria o caminho à vida eterna. (fonte: Louvre)
Há décadas, sabemos que a fumaça tem uma composição química complexa, em que diversas substâncias estão presentes conjuntamente no estado sólido e gasoso. Por estar envolta no ar quente, a fumaça sobe e se dissipa lentamente, até sumir frente a nossos olhos. Assim, parece que o ser humano antigo acreditava que esse material volátil continuaria a subir sempre, chegando aos deuses, e que seria capaz de acompanhar a alma aos céus.
Mas o uso do calor sobre o material vegetal não se limitou à queima e teve grande impacto histórico na comercialização das ervas aromáticas e medicinais, gerando um dos negócios mais lucrativos da humanidade. A secagem controlada de partes das plantas estende a vida útil delas, o que permitiu a comercialização a longa distância, com implicações na disputa de territórios e nas grandes guerras.
Homens e mulheres perfumavam os ambientes e a si mesmos, enquanto esses materiais eram usados no combate às doenças e na conservação dos alimentos. Hoje, sabemos que essas aplicações se devem às propriedades antimicrobianas de várias substâncias químicas naturais, por meio das quais as plantas se defendem do ataque de invasores.
Claudia Rezende
Instituto de Química
Universidade Federal do Rio de Janeiro